• Milene Saddi
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Tristeza, dor. angústia: como ensinar as crianças a lidarem com essas emoções? (Foto: Thinkstock)

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Um garoto de mochila nas costas corre debaixo de chuva para a escola, obrigado pelo pai, que segue dirigindo, de carro, atrás da criança. Um pai joga o laptop da filha no gramado e atira no equipamento. Uma mãe mostra o videogame que comprou para os filhos e anuncia que está indo levar o aparelho de volta para a loja - e vai. Uma mãe obriga o filho a comer pimenta e, em seguida, a tomar banho gelado enquanto grita com ele. Uma mãe obriga os filhos a segurarem uma placa na rua com os dizeres “crianças suspensas - lavagem de carro grátis”. Essas medidas corretivas, por si só, já são assustadoramente brutas. Mas há um componente que torna tudo ainda pior: as cenas, reais, foram gravadas em vídeo ou fotografadas e postadas em redes sociais.

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Uma reportagem do jornal britânico The Sun traz a estimativa alarmante de que há mais de 30 mil vídeos mostrando pais punindo publicamente seus filhos - child shaming, em inglês. Audiência garantida: a publicação contabiliza mais de 45 milhões de visualizações para esses vídeos.

Os casos acima aconteceram nos Estados Unidos, na Grã-Bretanha e até na Nova Zelândia. No Brasil, não faltam exemplos. Em uma busca rápida no Youtube, lá vem o primeiro: o menino está jantando - ou melhor, tentando jantar - enquanto o pai narra o que ele fez de errado; o menino pede que o pai não o faça, coloca a mão no rosto, na cabeça - parece sufocado, como fica quem está diante de um abusador.

Psiquiatras e coaches ouvidos na reportagem entendem que a prática tem potencial de causar baixa auto-estima e uma insegurança incapacitante nessas crianças, além de transmitir a mensagem de que elas são pessoas más, fracassadas. E mais: propagar os vídeos mostra mesmo é o mau comportamento dos pais.

Especialista em Comunicação Não-Violenta (CNV), conceito desenvolvido pelo psicólogo norte-americano Marshall Rosenberg (veja vídeo abaixo), a coach Carolina Nalon, do Instituto Tiê, aponta para o primeiro efeito da punição pública: quebra de confiança. “Antes do sermão, vale buscar entender o que levou a criança a fazer o que fez”, diz ela, sobre um ponto bem anterior ao dos casos relatados no início da reportagem. “A CNV fala da importância de pedir e não de exigir. E de se perguntar: por que alguém deve atender ao meu pedido? Se a criança faz o que foi solicitado pelo pai ou pela mãe por medo, culpa ou vergonha, então, há violência na comunicação”, explica.

criança; triste; castigo; tristeza (Foto: Thinkstock)

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Outra questão é a durabilidade desses vídeos na internet: praticamente eterna. “Não fomos educados para usar a internet, por isso, ainda não sabemos o efeito real dessas atitudes”, opina Carolina. “A criança vai poder buscar esse conteúdo depois. No futuro, me parece que esses filhos vão poder, inclusive, processar os pais”, prevê.

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Educar é difícil e crianças são capazes de tirar qualquer um do sério - dessas duas frases, ninguém duvida. Ainda assim, há limites para as broncas, certo? A resposta deveria ser sim, mas, aparentemente, a internet ampliou as fronteiras das já equivocadas medidas corretivas, que submetem crianças a situações de humilhação em nome da boa educação.

selo app crescer (Foto: Crescer)

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