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Foto demonstra semelhança entre Lucélia e a mãe biológica, descoberta mais de 30 anos depois da troca na maternidade (Foto: Arquivo Pessoal)

Foto demonstra semelhança entre Lucélia e a mãe biológica, descoberta mais de 30 anos depois da troca na maternidade (Foto: Arquivo Pessoal)

Lucélia de Araújo Barbosa tinha 33 anos de idade quando descobriu que Dona Zelina e Seu Jesuíno não eram seus pais biológicos. A notícia veio à tona em 2012, após uma reportagem em que outra mulher, nascida no mesmo dia e na mesma maternidade, dizia ter descoberto que havia sido trocada no hospital, e procurava sua verdadeira família. Desde então, a vida de todos nunca mais foi a mesma.

“A descoberta, tanto para mim quanto para os meus pais, foi muito forte, a gente ficou mal. Eu entrei em depressão. Foi um momento de muito sofrimento. Conviver com uma família 33 anos e descobrir que ela não é verdadeira não é fácil. Isso mexe comigo até hoje. Dói muito falar do assunto”, lembra Lucélia, em entrevista exclusiva a CRESCER.

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No último dia 2 de setembro, uma decisão de segunda instância da Justiça de São Paulo foi publicada no Diário Oficial dando a Seu Jesuíno e Dona Zelina o direito a uma indenização de R$ 500 mil (R$ 250 mil para cada um), a ser paga pela Prefeitura de Juquiá, responsável pela administração do Hospital Santo Antonio de Juquiá, onde ocorreu a troca, em outubro de 1979.

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Apesar de ainda caber recurso, o acórdão deu à família algum alívio. “A minha indenização saiu já há algum tempo, mas falta ainda concretizar esse direito dos meus pais. Estamos aguardando. Sabemos que nenhum dinheiro no mundo não vai apagar nem amenizar o que aconteceu. Mas o valor daria aos meus pais, já idosos e com problemas de saúde, uma velhice mais confortável”, diz.

O processo corre desde 2013. Em primeira instância, em dezembro de 2018, a Justiça determinou uma indenização de R$ 50 mil (R$ 25 mil para cada um dos pais de criação de Lucélia). A defesa da família recorreu e conseguiu, agora, ampliar o valor. “Antes do recurso, chegamos a tentar um acordo diretamente com o hospital, para evitar que o caso se prolongasse ainda mais, mas não houve interesse. Recorremos e achamos agora bastante razoável o valor proposto”, explica o advogado Joao Carlos Gonçalves de Freitas.

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Para Lucélia, a reparação judicial não trouxe a união entre as duas famílias. Ela conta que mantém contato com a mãe biológica (e manteve com o pai durante um ano, até seu falecimento), mas que continua considerando Dona Zelina e Seu Jesuíno como seus pais. “A gente mora perto, continua tudo igual. Na minha nova documentação, inclusive, tem o nome dos quatro. Não quis que retirassem nenhum”, afirma.

A notícia abalou o relacionamento de Lucélia com seus irmãos de criação, e inclusive com a outra bebê – hoje uma mulher – com quem foi trocada na maternidade. “Foi tudo muito difícil. Bagunçou a cabeça de todo mundo”, explica. Até mesmo os filhos de Lucélia, segundo ela, sofreram com a descoberta. “Foi um abalo muito grande, principalmente para minha filha”, conta a mãe de 4 filhos e avó de duas netas.

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“Eles ainda sofrem demais. Foram privados do convívio com a filha biológica e isso causa um abalo psicológico irreversível. Apesar da descoberta e do processo, as famílias se mantiveram praticamente do mesmo jeito. Não houve reparação psicológica. É uma sentença punitiva apenas a quem cometeu o erro. Mas a justiça não trouxe a união dessas famílias. Acho que não há reparação que dê jeito em uma situação como essa”, afirma.

CRESCER entrou em contato com a assessoria de imprensa da Prefeitura de Juquiá e não obteve retorno até a publicação desta reportagem.