• Nathália Armendro, do home office
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Ainda que não existam no Brasil números oficiais, estima-se que um bebê seja trocado no país a cada 6 mil partos – o que representaria 483 dos 2,9 milhões de nascidos vivos em 2018, segundo o IBGE. A fragilidade do sistema de identificação dos recém-nascidos dá espaço ainda para crimes como o tráfico de crianças e a chamada “adoção à brasileira” - quando um casal registra como sendo seu um filho de outra família, burlando o processo legal de adoção.

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Mas esse não é um problema identificado agora. Há mais de 10 anos tramitam no Legislativo diversos projetos de lei que pretendem aumentar a segurança dos bebês ao nascer, seja pelo uso de dispositivos nas pulseiras hospitalares ou pela identificação biométrica. O mais recente deles, o PL 9434/2017, prevê a informatização da identificação plantar e digital do recém-nascido, e o compartilhamento dos dados com bancos públicos. Mas o texto aguarda parecer do relator na Comissão de Finanças e Tributação (CFT) da Câmara dos Deputados há mais de um ano.

Enquanto a obrigatoriedade não avança na legislação, as maternidades apostam no Sistema Interligado de Certidão de Nascimento: uma troca de dados entre a maternidade e o cartório que permite que os pais já saiam da maternidade com a certidão de nascimento de seus bebês. Para garantir a segurança do processo (que é feito pela internet), ele tem certificação digital e fiscalização das corregedorias da justiça. A implantação é obrigatória desde março de 2017.

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No âmbito privado, uma solução corre em paralelo. Após oito anos de estudos, uma startup brasileira desenvolveu uma tecnologia inédita no mundo que garante a identificação biométrica de recém-nascidos ainda na sala de parto. A plataforma – chamada de INFANT.ID - faz a captura, análise e exportação de digitais em alta definição para bancos de dados públicos.

Dados biométricos do recém-nascido podem ser colhidos ainda na sala de parto (Foto: Divulgação/Natosafe)

Dados biométricos do recém-nascido podem ser colhidos ainda na sala de parto (Foto: Divulgação/Natosafe)

“Focamos nosso trabalho na solução do problema que é a identificação de crianças de 0 a 5 anos. O Estado não consegue, por exemplo, processar as imagens feitas com carimbo para o RG de uma criança nessa faixa etária. Não existe um sistema capaz de comparar, confrontar essas imagens, se for preciso. Ela é quase um borrão, não interage com uma base de dados efetivamente. E isso inviabiliza seu uso em uma eventual investigação, por exemplo. Essa lacuna tem consequências gravíssimas em diversas esferas, desde o âmbito da segurança dentro das maternidades, com a troca de crianças, até a falsidade ideológica, já que muitos documentos são fraudados a partir desses primeiros documentos. Quando não se tem um vínculo biométrico, não se consegue ter um documento seguro”, explica à CRESCER Ismael Akyiama, CEO da Natosafe.

Atualmente, pela legislação brasileira, toda criança nascida viva precisa ser devidamente registrada no Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos (Sinasc). A forma de fazer com que essa criança seja reconhecida pelo governo é a Declaração de Nascido Vivo, a DNV, que deve ser levada até um cartório para que seja efetivado o registro da criança.

A questão é que esse “formulário” que é a DNV pode ser retirado por qualquer pessoa, em um cartório ou hospital, sob a alegação de que teve seu filho em casa ou no carro, por exemplo, sem a ajuda de uma parteira. Com a DNV em mãos, qualquer pessoa registra um bebê como sendo seu – o que dá margem ao tráfico de crianças e à adoção “à brasileira”.
O que a Natosafe pretende fazer é, através da captura biométrica dos recém-nascidos ainda na sala de parto, vinculá-los à mãe, em alta definição, evitando trocas e a possibilidade de evasões de bebês dos hospitais.

São coletados tanto impressões dos dedos quanto dos pés dos bebês (Foto: Divulgação/Natosafe)

São coletados tanto impressões dos dedos quanto dos pés dos bebês (Foto: Divulgação/Natosafe)

Esse sistema, explica Ismael, é preparado para interagir com todos os sistemas públicos já existentes, por isso, serve para a emissão dos documentos futuros das crianças, sempre atrelados à biometria da mãe. Atualmente, porém, a solução só está disponível para ser comprada por governos ou pela iniciativa privada, como hospitais – a um custo estimado de cerca de R$ 10,00 por criança. Ainda não é possível adquirir o serviço individualmente, como pais, por exemplo.

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Os governos de Goiás e Pernambuco foram os primeiros do Brasil a se interessar pela plataforma. Em Goiás, o sistema começou a ser implantado em junho, para usuários da assistência de saúde aos servidores públicos. O projeto permite que as crianças já saiam da maternidade com acesso aos serviços de saúde. Além disso, ele também tornou possível a emissão da certidão de nascimento com CPF e a verificação de reconhecimento biométrico do bebê junto à sua mãe antes da alta da maternidade, mas ainda está disponível a poucas pessoas e caminha para se expandir nos próximos meses.

Em Pernambuco, a empresa tem uma parceria com o IITB (Instituto de Identificação Tavares Buril) e a Secretaria de Estado da Saúde para coletar digitais de mães e bebês foram coletadas a fim de primorar a solução, sob a supervisão dos peritos papiloscopistas do IITB.