Encontrar vagas para os filhos na educação infantil da rede pública é uma tarefa desafiadora. Atualmente, 632.763 crianças estão aguardando por uma vaga em creches públicas no Brasil. Em quase metade dos municípios brasileiros (44%), há crianças em fila de espera para fazer a matrícula na educação infantil. Foi o que apontou os dados do levantamento nacional Retrato da Educação Infantil no Brasil — Acesso e Disponibilidade de Vagas, divulgado na última terça-feira (27) e realizado pelo Gabinete de Articulação para a Efetividade da Política da Educação no Brasil (Gaepe-Brasil), composto pela sociedade civil e entidades do poder público, entre elas o Ministério da Educação (MEC).
O estudo, feito entre 18 de junho e 5 de agosto, tem como objetivo disponibilizar informações sobre o acesso da população à educação infantil para criar um plano de ação voltado à expansão da oferta de vagas para os pequenos.
Vale lembrar que a Constituição Federal de 1988 garante o direito das crianças ao acesso a creches e pré-escolas de qualidade. As creches são destinadas às crianças até os 3 anos de idade, ou que tenham 4 anos, se completados após 31 de março de cada ano, data que estabelece o corte etário para ingresso na pré-escola. Já na pré-escola a frequência é obrigatória para crianças de 4 e 5 anos de idade ou que tenham 6 anos, completados após 31 de março, quando a criança deve ingressar no ensino fundamental. No entanto, os dados indicam que o Brasil enfrenta um grande desafio para ampliar o acesso à educação infantil.
Creche
Todos os 5.569 municípios e o Distrito Federal participaram do levantamento nacional Retrato da Educação Infantil no Brasil — Acesso e Disponibilidade de Vagas, realizado ao longo de 48 dias. Dos municípios, 2.445 (44%) têm fila de espera nessa etapa; 7% não fizeram essa identificação de falta de vagas; e 184 (3%) não têm creche, segundo o Censo Escolar da Educação Básica de 2023. Ao considerar exclusivamente o total de cidades com filas de espera em creches, 88%, 2.160 cidades, relatam que o principal motivo é a falta de vagas.
Na pesquisa, como os municípios puderam marcar mais de um motivo pelos quais os responsáveis não matricularam suas crianças em creches, aparecem outras explicações, como opção dos pais, por entender que as crianças são pequenas demais para ir à creche ou que a primeira infância deve ser vivida em família; desconhecimento sobre o processo de matrícula e de prazos; distância entre a residência e a instituição de ensino; falta de transporte adequado, principalmente, em áreas rurais; incompreensão sobre a importância da educação infantil; mudanças frequentes de endereço da criança.
No registro total das mais de 632,7 mil crianças na fila por vaga em creche por faixa etária, 123 mil (19%) têm até 11 meses de idade; 178,4 mil (28%), 1 ano; 165,4 mil (26%) têm 2 anos; 131,4 mil (21%) têm 3 anos; e 34,3 mil (5%), 4 anos. Entre as regiões, o Sudeste tem 212,5 mil crianças fora de creches. A região é seguida pelas crianças do Nordeste (124,3 mil); Sul, com 123,3 mil crianças desassistidas; Norte, 94,3 mil; finalizando com o Centro-Oeste, 78,1 mil crianças sem vagas em creches.
Pré-escola
Sobre a pré-escola, em números absolutos há 78.237 registros de crianças que não frequentam essa etapa de ensino, sendo que 50% (39.042) estão nessa situação porque a rede não têm vagas. Em relação aos municípios, na faixa etária relativa à pré-escola o percentual de crianças que deveriam estar matriculadas é 8%. As principais razões são a não realização da matrícula pelos responsáveis, em sete de cada dez desses municípios; e a falta de vagas, em quatro de cada dez.
Idade mínima
No Brasil, apenas 11% dos municípios iniciam o atendimento das crianças em creches sem prever idade mínima para ingresso. Nos demais, há idades estipuladas: 52% começam a atender bebês entre 1 mês e 11 meses; 22%, crianças entre 1 ano e 1 ano e 11 meses; 11% entre 2 anos e 3 anos incompletos; e 3% atendem apenas a partir dos 3 anos de idade.
Prioridades
No país, 44% dos municípios têm critérios de priorização do atendimento em creches, enquanto 56% ignoram essas condições. O principal parâmetro considerado pelas redes de educação pública (64%) é a situação de risco e vulnerabilidade, que se refere, especialmente, a crianças encaminhadas por órgãos como o conselho tutelar, assistência social e Ministério Público.
Outros fatores mais apontados para a definição de ordem na fila por vaga em uma creche são crianças com deficiências, transtornos globais do desenvolvimento e necessidades educacionais especiais, como altas habilidades ou superdotação (48%); responsáveis que trabalham fora (48%) no período de aula; famílias de renda familiar (38%), particularmente aquelas inscritas no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal (CadÚnico) ou beneficiárias do Bolsa Família; mães solo e/ou mães adolescentes (23%), especialmente, aquelas que estudam ou trabalham; proximidade da residência (17%); encaminhamentos especiais (9%) determinados judicialmente ou por órgãos de proteção; ordem de inscrição na lista de espera (6%); demais ocorrências (7%), como a presença de irmãos matriculados na mesma instituição, mães que trabalham em áreas rurais e crianças em situação de acolhimento institucional.
Transparência
Os municípios são obrigados a divulgar a lista por vagas nos estabelecimentos de educação básica de sua rede de ensino, conforme determina a Lei 14.685/2023. No entanto, apenas 25% das cidades tornam público o número de vagas existentes em creches, aponta o estudo. Outros dados divulgados no levantamento são as ações municipais para garantir a matrícula e frequência de crianças em idade pré-escolar que estão fora das salas de aula: 68% das prefeituras fazem a busca ativa de crianças, mas as famílias não procuraram atendimento, incluindo visitas domiciliares, campanhas de conscientização e parcerias com conselhos tutelares e assistentes sociais.
As ações ainda incluem a divulgação de campanhas de conscientização e sobre o período de matrículas em redes sociais e outros meios de comunicação; o uso de sistemas informatizados e cruzamento de dados para identificação de crianças fora da escola; e por fim, planos de ampliação de salas de aula e a criação de vagas adicionais para atendimento do público alvo.
Ações
O Ministério da Educação afirmou que, até 2026, planeja construir 2,5 mil novas creches e pré-escolas por meio do Novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Além do Novo PAC, o Pacto Nacional pela Retomada de Obras da Educação Básica pretende concluir todas as obras paralisadas e inacabadas da educação básica.
De acordo com a secretária de Educação Básica do MEC, Kátia Schweickardt, foram investidos mais de R$ 1 bilhão na educação infantil. “Desde 2023, foram R$ 592 milhões investidos pelo Programa Escola em Tempo Integral, nessa etapa educacional; outros R$ 492 milhões investidos pelo Programa de Apoio à Manutenção da Educação Infantil e, ainda, R$ 93 milhões aplicados no Programa Leitura e Escrita na Educação Infantil. Além disso, já entregamos 378 novas creches”, a secretária afirmou.