Ozempic e fertilidade: Remédio para emagrecer pode ajudar a engravidar?

Uma delas foi a americana Mariah Deloach. No Tiktok, ela contou que engravidou depois de seis meses tomando o Ozempic. "Descobri que estava grávida depois de perder 40 quilos. Eu tenho síndrome dos ovários policísticos e problemas de tireoide. Nosso bebê nascerá em 24 de julho", escreveu.

Mas Mariah não é a única. Foram tantas histórias parecidas pipocando nas redes sociais que os internautas até deram um nome para esse fenômeno: os "bebês Ozempic". Algumas mulheres relataram engravidar depois de anos de infertilidade ou, então, enquanto usavam métodos contraceptivos.

As histórias geraram um debate nas redes sociais e levantaram muitas dúvidas sobre a relação entre o uso do medicamento e tantas gestações confirmadas durante o tratamento. Afinal, o Ozempic ajuda mesmo a engravidar? Qual a relação entre remédios para emagrecer e aumento da fertilidade?

Ozempic é o nome comercial dado a um medicamento desenvolvido pela farmacêutica Novo Nordisk para o tratamento de diabetes tipo 2. Sua substância ativa é a semaglutida. Ela funciona imitando a ação do GLP-1, um hormônio natural do corpo que ajuda a controlar os níveis de açúcar no sangue. Consequentemente, ela ajuda também a controlar o diabetes, a reduzir o apetite e levar à perda de peso.

Porém, o Ozempic não é o único medicamento do mercado que promove esses resultados. Wegovy, Rybelsu, Mounjaro... Todos eles também imitam a ação do hormônio GLP-1. Tanto é que casos de "bebês Ozempic" também estão sendo relatados por mulheres que fazem uso desses outros medicamentos. Na prática, a diferença entre eles é a substância ativa, a dosagem, a forma de administração e as indicações para uso.

"Essa classe de medicamentos foi usada inicialmente para tratamento de diabetes. Depois, se viu que poderia ter outras funções, como se ligar ao sistema nervoso central e promover a saciedade. Mas ainda existem muitas coisas sobre ele que a gente ainda não sabe", explica a endocrinologista Simone Lee, diretora do Departamento de Obesidade da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM).

Um dos "mistérios" envolvendo essa classe de medicamentos ainda é justamente qual a relação entre o seu uso e um possível aumento na fertilidade, como vem sendo relatado por várias mulheres nas redes sociais. Os médicos até possuem hipóteses do que pode estar por trás dessa associação, mas ainda não existem números oficiais e nem estudos científicos robustos que comprovem isso.

"Não tem nenhuma evidência científica que esse aumento da fertilidade seja um efeito direto do remédio. O que podemos falar é que isso talvez seja um efeito da perda de peso causada pelo remédio. Tanto é que também vemos a fertilidade aumentar em pacientes que passaram por cirurgia bariátrica, por exemplo", afirma Simone Lee, da SBEM.

A ginecologista Maria Celeste Osório Wender, presidente da FEBRASGO, também concorda com essa hipótese. Segundo ela, a maior facilidade para engravidar provavelmente está associada à perda de peso que algumas mulheres observam durante o tratamento com o Ozempic ou remédios similares. "Mulheres obesas têm mais dificuldade para engravidar, porque cria-se um ambiente inflamatório na região do abdômen, muitas nem ovulam. De repente, elas usam o remédio, perdem peso e voltam a ovular. Fica mais fácil de engravidar mesmo", explica.

Uma outra hipótese levantada por alguns especialistas é a de que remédios à base de semaglutida ou que imitam a ação do hormônio GLP-1 poderiam "cortar o efeito" ou reduzir a absorção de anticoncepcionais hormonais, especialmente a pílula. Na teoria, isso ajudaria a explicar por que tantas mulheres têm engravidado durante o tratamento com Ozempic.

A lógica por trás dessa ideia é a de que, como esse tipo de medicamento aumenta a saciedade e retarda o processo de esvaziamento do estômago, talvez ele pudesse também afetar a forma como o organismo absorve a pílula anticoncepcional. Porém, já existem pesquisas científicas que descartam essa possibilidade.

"Quando desenvolvemos um remédio, fazemos estudos em conjunto com as medicações mais utilizadas pela população. Estudos desse tipo foram feitos com a semaglutida e foi comprovado que não há alterações no funcionamento da pílula. Inclusive, é indicado que as mulheres continuem usando o anticoncepcional durante o tratamento", esclarece Simone Lee, da SBEM.

Se o teste positivo vier de surpresa e a gravidez for confirmada, a recomendação é de que a mulher pare imediatamente de tomar remédios que imitam a ação do hormônio GLP-1. "Essa é uma recomendação dos próprios laboratórios. Não existem dados para saber se é seguro para mulheres grávidas e qual pode ser o impacto no bebê", reforça Maria Celeste, da FEBRASGO.