• Nathalia Fabro
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1. Australophyllia wilsoni. Espécie de coral-cérebro descrita recentemente que prefere habitar regiões de águas frias. É encontrada entre algas nos recifes  subtropicais da  Austrália Ocidental  (Foto: Coral Morphologic)

1. Australophyllia wilsoni. Espécie de coral-cérebro descrita recentemente que prefere habitar regiões de águas frias. É encontrada entre algas nos recifes subtropicais da Austrália Ocidental (Foto: Coral Morphologic)

Desde a adolescência, Colin Foord é fascinado pelos oceanos. Nascido e criado no frio do estado norte-americano de New Hampshire, decidiu morar na calorosa Flórida para cursar Biologia Marinha na Universidade de Miami. Na graduação, conta, descobriu que seus professores sabiam pouquíssimo sobre corais, animais cnidários que vivem principalmente em águas tropicais.

Além da falta de referências acadêmicas, Foord relata que seus mentores tampouco tinham interesse em aprender mais sobre esses seres. Inconformado, convidou o amigo de infância, o músico Jared McKay, para estudar as criaturas.

Foi assim que, em 2007, eles fundaram a Coral Morphologic, iniciativa que une arte e ciência para divulgar a importância desses bichos para o planeta. A dupla documenta, fotografa, filma e até ajuda a produzir canções sobre corais que eles criam em tanques — ou, como chamam, em um “estúdio multimídia de aquacultura”.

As imagens chamam a atenção porque mostram em detalhes os formatos, texturas e cores desses organismos. Alguns desses registros já integraram produções do canal BBC e da National Geographic, como a série documental One Strange Rock (2018), que foi apresentada pelo ator Will Smith e está disponível na Netflix no Brasil. O projeto também foi o tema central do documentário Coral City (2015), do diretor John McSwain.

Alguns corais brilham devido à presença de uma proteína fluorescente, cuja função biológica ainda não é totalmente compreendida pelos cientistas. “Se você trouxer um coral para a superfície, o brilho fluorescente será bloqueado pelos raios solares. Muitas pessoas questionam se isso é real, mas claro que é”, afirma Foord à GALILEU.

Para conseguir captar as cores e o brilho dos corais com boa nitidez, ele e McKay utilizam câmeras à prova d’água, microscópios e até equipamentos semelhantes aos empregados em pesquisas forenses, como a luz ultravioleta, que identifica amostras de sangue no escuro, por exemplo.

2. Cycloseris sp. Da família Fungiidae, da ordem dos corais escleractínios do Indo-Pacífico, ele tem uma boca no centro do corpo e é capaz de se revirar quando precisa encontrar uma posição melhor para ficar (Foto: Coral Morphologic)

2. Cycloseris sp. Da família Fungiidae, da ordem dos corais escleractínios do Indo-Pacífico, ele tem uma boca no centro do corpo e é capaz de se revirar quando precisa encontrar uma posição melhor para ficar (Foto: Coral Morphologic)

A dupla tem aproximadamente 300 espécies. “Uma amostra muito pequena da quantidade que existe no oceano”, comenta Foord. Os exemplares foram retirados da Baía Biscayne, laguna que liga as cidades de Miami e Miami Beach. Nas partes submersas das pistas de carros da região surgiram os “corais urbanos”, como são chamados aqueles que não crescem em recifes de corais, seu habitat mais comum. “Ter corais na área urbana é algo que não imaginávamos que poderia acontecer”, encanta-se.

3. Homophyllia australis. É uma espécie solitária original das águas profundas da Grande Barreira de Corais. Com até 10 cm de diâmetro, abre os tentáculos à noite para comer camarões e  pequenos organismos (Foto: Coral Morphologic)

3. Homophyllia australis. É uma espécie solitária original das águas profundas da Grande Barreira de Corais. Com até 10 cm de diâmetro, abre os tentáculos à noite para comer camarões e pequenos organismos (Foto: Coral Morphologic)

Os pesquisadores mergulham pelo menos duas vezes ao mês na Baía Biscayne. Para retirar e analisar fragmentos dos corais, atualmente a Coral Morphologic trabalha em conjunto com a Administração Oceânica e Atmosférica Nacional (NOAA, na sigla em inglês), órgão governamental dos EUA, e com a Universidade Internacional da Flórida. O objetivo é estudar o microbioma e a genética dos animais.

“Corais de recifes estão morrendo com mais frequência do que os corais urbanos e queremos entender por que isso está acontecendo”, explica Foord. Ele diz acreditar que o projeto possa ajudar a entender como esses seres se adaptam às mudanças climáticas e a outras alterações no ambiente.

4. Trachyphyllia geoffroyi. Este coral- -cérebro aberto costuma escolher como morada áreas mais distantes do recife. Ele possui um tecido muito carnudo que pode ser bem colorido e fluorescente (Foto: Coral Morphologic)

4. Trachyphyllia geoffroyi. Este coral-cérebro aberto costuma escolher como morada áreas mais distantes do recife. Ele possui um tecido muito carnudo que pode ser bem colorido e fluorescente (Foto: Coral Morphologic)

Foord conta que, no início, sentiu dificuldades para fazer a Coral Morphologic acontecer. “Há quem prefira estudar os corais no Caribe ou na Ásia. Entrar no mar de Miami parecia uma ideia sem sentido. Mas há muitas descobertas a serem feitas em nosso quintal.”

Ele e McKay inclusive já identificaram novas espécies e conseguiram detectar a presença de corais estrangeiros — espécies de outras partes do mundo que chegaram à Flórida provavelmente grudadas em embarcações.

5. Platygyra sp. Pertence a um gênero de  corais natural do Mar Vermelho. Ele tem o papel de fornecer habitat para muitos organismos dos recifes, como os bivalves e a chamada poliqueta--árvore-de-natal (Foto: Coral Morphologic)

5. Platygyra sp. Pertence a um gênero de corais natural do Mar Vermelho. Ele tem o papel de fornecer habitat para muitos organismos dos recifes, como os bivalves e a chamada poliqueta--árvore-de-natal (Foto: Coral Morphologic)

Fora as pesquisas, Foord e McKay também podem comemorar o feito de colocar os corais nos palcos: em 2018, o grupo Animal Collective lançou, em parceria com a dupla, o álbum Tangerine Reef. As 13 faixas foram inspiradas nos movimentos dos corais. “É algo bem experimental e teve um resultado muito bom”, orgulha-se Foord. “Nunca quisemos fazer algo estritamente científico, pois poucas pessoas teriam acesso. Queremos inspirar e engajar.”