• Rebecca Willis, para o The Conversation*
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 Para especialista, determinar objetivos não é o suficiente: é preciso entrar em ação (Foto: Pixabay)

Para especialista, determinar objetivos não é o suficiente: é preciso entrar em ação (Foto: Pixabay)

Se metas fossem suficientes para vencer a crise climática, teríamos motivos para comemorar. O Reino Unido, a Noruega, a Suécia e a França estabeleceram uma meta de emissões net-zero na lei, e 15 outros países estão considerando criar uma legislação semelhante ou têm metas não vinculativas. Centenas de cidades, regiões e empresas fizeram promessas semelhantes. [O termo "emissões net-zero" indica a neutralização dos gases causadores do efeito estufa emitidos pelo homem, que é realizada por medidas de redução.]

Há discussões se esses alvos são bons o suficiente. Uma leitura atenta dos relatórios do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas sugere que os países desenvolvidos precisam atingir emissões net-zero dentro de dez a 15 anos para dar alguma margem aos países em desenvolvimento. 

Ainda assim, essa lógica mascara uma verdade mais fundamental: esses objetivos são, por definição, uma declaração de intenção — e mais nada. Por si só, eles não removem uma única molécula de dióxido de carbono da atmosfera.

Na verdade, há evidências que sugerem que essas medidas até podem ser contraproducentes. O Reino Unido foi o primeiro do mundo a introduzir metas vinculativas de carbono há uma década —, mas os governos desmontaram ou reduziram muitas políticas climáticas nos últimos anos. Assessores governamentais independentes, o Comitê de Mudanças Climáticas, alertaram várias vezes que o Reino Unido não está no caminho para cumprir compromissos futuros.

No entanto, sempre que os ministros do governo são questionados sobre a política climática, suas respostas são indignadas. "É claro que levamos a sério a luta contra as mudanças climáticas", dizem eles, "porque temos metas ambiciosas". Por essa lógica, qualquer política pode ser considerada — mesmo que mova as emissões na direção errada. Nas palavras dos pesquisadores independentes do Institute for Government, as metas podem ser "uma maneira de baixo custo para o governo dar a aparência de realizar ações vigorosas".

Se os governos levam a sério a luta contra a crise climática, são necessárias políticas radicais para atingir metas radicais. Aqui estão cinco medidas com impactos imediatos que os colocariam no caminho certo.

1. Uma tarefa para todos os departamentos
A responsabilidade pela ação climática não deve ser atribuída a um ministério individual. O Gabinete do Primeiro Ministro ou o Tesouro (e escritórios equivalentes em todo o mundo) devem ser encarregados de coordenar a ação climática em todas as áreas do governo, exigindo que cada ministério demonstre progresso.

O Ministério dos Transportes do Reino Unido, por exemplo, atualmente poderia assumir que os aumentos nas emissões de transporte serão compensados ​​por reduções em outras partes da economia. Com a configuração proposta, seria necessário mostrar como suas políticas contribuíriam para os cortes de emissões.

2. Trazer o público à tona
O segundo é envolver as pessoas na transição para as emissões net-zero. Minha pesquisa mostrou que os políticos tentaram impor políticas climáticas furtivamente, evitando discussões abertas e assumindo que os especialistas sabem mais. Isso é profundamente antidemocrático e é muito provável que não funcione.

A ação climática deve ser vista como uma negociação constante entre cidadão e Estado — um contrato social. Pesquisas mostram que as pessoas estão dispostas a fazer mudanças em suas próprias vidas se virem isso como parte de um esforço nacional mais amplo para reduzir as emissões.

Acabar com a queima de carvão mineral para a produção de energia elétrica é uma das mais importantes medidas para conter o aquecimento global. (Foto: Creative Commons / MonikaP)

Acabar com a queima de carvão mineral para a produção de energia elétrica é uma das mais importantes medidas para conter o aquecimento global. (Foto: Creative Commons / MonikaP)

Um maior uso de formas políticas participativas, como as Assembleias de Cidadãos, poderia ajudar a desenvolver estratégias climáticas que envolvam a população ao invés de ignorá-la. Também precisamos trabalhar em estreita colaboração com as comunidades que, de outra forma, estariam perdendo com a ação climática, como mineradoras de carvão e petroleiros, para lhes proporcionar uma "transição justa" do carbono. Isso significa suporte abrangente, não apenas uma vaga promessa na área de "empregos verdes".

3. Políticas simbólicas
Os governos devem implementar o que a especialista em opinião pública Deborah Mattinson chama de "políticas simbólicas". São políticas com impactos tangíveis que também elevam o perfil político da ação climática. Elas estimulam os cidadãos e enviam às empresas uma mensagem clara sobre o clima de que se espera investimento [nessa causa] no futuro, catalisando mudanças radicais, e não incrementais.

O direito de gerar e vender energia renovável em casa ou na comunidade pode ser uma dessas políticas. A proibição de anunciar carros a gasolina e diesel, que muitos países estão eliminando de qualquer maneira, seria outra. A garantia de "empregos verdes", como proposto pelo Green New Deal, dos EUA, também chamaria a atenção. Finalmente, com mensagens cuidadosas, as permissões pessoais e comerciais de carbono podem ser altamente eficazes na redução de emissões — e surpreendentemente populares.

4. "Mantenha-o no chão"
Uma estratégia para a emergência climática é assumir compromissos explícitos e tangíveis sobre a transição dos combustíveis fósseis. É claro que o compromisso global de limitar o aquecimento a 1,5 ℃ exige que deixemos intocadas as reservas de combustíveis fósseis mais conhecidas. O slogan ativista “mantenha-o no chão” é uma representação precisa das melhores evidências científicas.

Até agora, a maioria das estratégias climáticas ficou em silêncio nesse ponto. O Reino Unido e a Noruega se congratulam com metas zero-net, mas ambos planejam continuar a extração de petróleo e gás. Os governos devem impor uma moratória à exploração de combustíveis fósseis, acabar com os £ 300 bilhões em incentivos fiscais que concedem anualmente às indústrias de combustíveis fósseis, e usar o dinheiro de reposição para ajudar trabalhadores e indústrias na transição para uma revolução de energia limpa.

5. Separe a captura de carbono
Por fim, qualquer estratégia nacional deve separar a contribuição das tecnologias de emissões negativas de suas metas de net-zero. A teoria é que as emissões de carbono que não puderem ser evitadas serão contrabalançadas por essas tecnologias.

Mas, como mostram pesquisas minhas e de meus colegas da Universidade de Lancaster, contar com essas tecnologias — cuja viabilidade ainda não é conhecida — funciona como distração dos recursos [realmente efetivos] de redução da quantidade de carbono que emitimos. A criação de metas e financiamento distintos para a captura de carbono fundamentará o setor no que ele pode realisticamente esperar remover da atmosfera, e interromperá as promessas mais selvagens e infundadas, que limitam a ambição por ação climática.

Eu nunca argumentaria contra o estabelecimento de metas climáticas. Elas são necessárias —, mas estão longe de ser suficientes. Devemos nos proteger contra os políticos que se escondem atrás de promessas distantes e possivelmente vazias, e exigir políticas climáticas que impactem o tópido do carbono aqui e agora.

*Pesquisadora da Universidade de Exeter University e profeddora da Universidade de Lancaster. Este artigo foi escrito em inglês e originalmente publicado no site The Conversation.

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