• Redação Galileu
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Pacientes hospitalizados com Covid-19 ainda têm problemas 1 ano após internação (Foto: Sharon McCutcheon/Unsplash)

Pacientes hospitalizados com Covid-19 ainda têm problemas 1 ano após internação (Foto: Sharon McCutcheon/Unsplash)

Embora a maioria dos sintomas se resolva dentro de 12 meses, cerca de metade das pessoas hospitalizadas com Covid-19 lida com pelo menos um efeito colateral prolongado da infecção pelo Sars-CoV-2 um ano após a internação. A descoberta é resultado de uma pesquisa conduzida por especialistas no Hospital Jin Yin-tan, em Wuhan, na China, e foi publicada nesta quinta-feira (26) no The Lancet

A investigação considerou 1.276 pacientes que foram hospitalizados com a doença e receberam alta entre 7 de janeiro e 29 de maio de 2020. “Até agora, nosso estudo é o maior já feito para avaliar a evolução de pacientes hospitalizados por Covid-19 um ano após a infecção. Enquanto a maioria teve uma boa recuperação, os problemas de saúde persistiram em alguns pacientes, especialmente os que enfrentaram quadros mais graves no hospital”, explica o professor Bin Cao, do Centro Nacional para Medicina Respiratória da China, em declaração à imprensa.

Uma a cada três pessoas teve falta de ar e, como notam os especialistas, deficiências pulmonares, como redução do fluxo de oxigênio do pulmão para a corrente sanguínea, também foram comuns, principalmente em quem teve um quadro mais grave da Covid-19. No geral, foi possível concluir que sobreviventes do coronavírus ficaram menos saudáveis do que as pessoas que não se contaminaram.

Para a análise, os mais de mil participantes passaram por exames de saúde detalhados aos 6 e 12 meses, contados a partir do primeiro dia em que os sintomas de Covid-19 foram observados. Os pesquisadores utilizaram questionários, avaliações físicas, testes de laboratório e atividades de caminhada para avaliar a qualidade de vida e possíveis reações prolongadas à infecção. A idade média dos voluntários contemplados pela investigação era de 57 anos e eles já haviam integrado um trabalho anterior, que ficou responsável pelo check-up aos 6 meses e mostrou que cerca de 75% dos 1.733 voluntários apresentaram problemas persistentes.

Comparando os resultados dos dois artigos, é possível observar que houve uma queda de pessoas enfrentando ao menos um sintoma prolongado. Aos 6 meses, elas representavam 68% dos voluntários. Já aos 12 meses, o número caiu para 49%.

De acordo com os cientistas, após um ano, 20% dos pacientes relataram fadiga ou fraqueza muscular e 30% reportaram falta de ar — aos 6 meses, esses números foram de 52% e 26%, respectivamente. Problemas respiratórios foram mais comuns entre os indivíduos que tiveram quadros graves da doença e utilizaram ventilador de oxigênio.

Quanto à saúde mental, 26% afirmaram ter sintomas de ansiedade ou depressão após um ano (a taxa era de 23% aos 6 meses). “Não entendemos completamente o motivo pelo qual sintomas psiquiátricos são mais comuns aos 12 meses do que aos 6”, diz Xiaoying Gu, do Instituto de Ciências Médicas Clínicas. “Isso pode ser causado por processos biológicos ligados à infecção viral ou à resposta imune do corpo. Mas também isso pode estar ligado a redução do contato social, solidão, recuperação incompleta da saúde ou perda de emprego.”

Aos 12 meses, foi considerado o status de trabalho dos pacientes. O artigo revela que, excluindo os aposentados, 88% dos participantes retornaram ao ofício normal e 76% conseguiram recuperar seu ritmo usual em um ano. Entre os que não voltaram para seus empregos, 32% citaram menor capacidade física, 25% não estavam dispostos a retornar e 18% estavam desempregados.

Além disso, os pesquisadores observaram que, na comparação com homens, as mulheres foram 1,4 vez mais prováveis de enfrentar fadiga ou fraqueza muscular, 2 vezes mais prováveis de reportar ansiedade ou depressão e 3 vezes mais prováveis de apresentar deficiências pulmonares após 12 meses da internação. Outro aspecto que veio à tona foi que as pessoas tratadas com corticóides na fase aguda da doença foram 1,5 vez mais prováveis de relatar fadiga ou dor muscular do que as que não receberam esses medicamentos.

“Nós não tínhamos dados dos participantes referentes ao período anterior à infecção por Covid-19. Porém, o estado de saúde de pessoas [não infectadas] condizentes com idade, sexo e condições pré-existentes dos pacientes nos dá uma comparação útil e pode nos auxiliar a entender o impacto da doença na qualidade de vida”, afirma a pesquisadora Lixue Huang, da Universidade Capital Medical. Dessa forma, foi possível notar que os sobreviventes da Covid-19 reportaram mais dor ou desconforto e problemas de mobilidade do que o restante da comunidade que não se infectou.

Os autores do artigo destacam, entretanto, que o estudo considerou apenas um hospital e, portanto, mais investigações são necessárias para compreender-se as consequências de longo prazo do coronavírus, especialmente entre as pessoas admitidas em Unidades de Terapia Intensiva (UTIs), que foram contempladas em menor número na pesquisa (somente 94 dos 1.276 participantes).

Diante dessas informações, os pesquisadores defendem que a área da saúde precisa estar preparada para atender e dar suporte a pessoas com Covid-19 longa. “Nossas descobertas sugerem que a recuperação de alguns pacientes tomará mais de um ano, e isso deve ser levado em consideração quando planejarmos serviços de saúde pós-pandemia”, conclui Bin Cao.

Logo após publicar o estudo, o The Lancet publicou um editorial que destaca justamente os impactos, inclusive econômicos, da Covid-19 longa. Os autores afirmam que a condição afeta a habalidade das pessoas retomarem a vida normal, incluindo sua capacidade de trabalhar, e dizem que isso pode levar a perdas econômicas e de produtividade.

"Os profissionais de saúde devem reconhecer e validar as cobranças [geradas pelos] sintomas persistentes da Covid-19 longa nos pacientes", lê-se no editorial. "A Covid-19 longa é um desafio médico moderno de primeira ordem. ”