• Redação Galileu
Atualizado em
Significado de palavras que definem sentimentos muda de acordo com idioma (Foto: Pixabay)

Significado de palavras que definem sentimentos muda de acordo com idioma (Foto: Pixabay)

O que é o amor? Para muita gente esse é um sentimento bem difícil de explicar, ainda mais porque diferentes pessoas constumam ter diferentes respostas para essa questão. E agora uma nova pesquisa publicada na Science, promete complicar ainda mais a definição dessa e de várias outras emoções.

Isso porque os pesquisadores descobriram que o significado das palavras que denominam sentimentos muda de acordo com o idioma — mesmo se elas forem sinônimas nas línguas diferentes. "Andamos por aí assumindo que a experiência de todos os outros é a mesma que a nossa, porque a denominamos com a mesma palavra, e esse estudo sugere que esse pode não ser o caso", afirmou Kristen Lindquist, líder do estudo, ao Los Angeles Times.

Ao analisar palavras de quase 2,5 mil idiomas, os pesquisadores descobriram que termos que descrevem emoções, como raiva e felicidade, podem ter significados muito diferentes, dependendo da cultura e da geografia de onde se originaram. A pesquisa revela que, embora alguns temas comuns existam na árvore genealógica da linguística, ideias aparentemente equivalentes evoluíram umas das outras, moldadas em parte pelas diferentes maneiras pelas quais as pessoas ao redor do mundo expressam seus sentimentos.

Por exemplo, na língua havaiana a palavra "pu’iwa", usada para o sentimento de surpresa, está também associada ao medo. Enquanto isso, as línguas Tai-Kadai, faladas no sudeste da Ásia, o termo utilizado para denominar o sentimento de "surpresa" está associado com a ideia de querer algo e de esperança.

Para chegar a essas conclusões, a equipe usou um banco de dados com mais de 100 mil termos abrangendo as 20 principais famílias de idiomas. Então, os pesquisadores classificaram essas palavras em milhares de categorias conceituais, incluindo 24 centradas em emoções comuns como amor, angústia e orgulho.

Dessa forma, eles perceberam que muitas palavras se enquadravam em várias categorias, uma peculiaridade comum da terminologia chamada "colexificação". Ou seja, um mesmo termo pode abranger mais de um conceito — em português, por exemplo, "manga" pode ser uma parte da camisa ou uma fruta.

De acordo com o que Joshua Conrad Jackson, um dos autores do artigo, disse ao The Guardian, isso pode significar que não existem conceitos universais para definir as emoções. "As pessoas podem universalmente ter a experiência de fazer o coração bater mais rápido quando ameaçadas. No entanto, há variabilidade na maneira como entendemos essa experiência, nos comportamentos que associamos à experiência e na maneira como comunicamos verbalmente a experiência a outras pessoas”, explicou.

Outro exemplo utilizado pelos pesquisadores foi a ideia de raiva. Enquanto nos idiomas indo-europeus essa emoção está associada à "ansiedade", em línguas austroasiáticas seu significado tem mais a ver com "luto" ou "arrependimento".

“Meu parceiro lituano diz que quando está com raiva moderada, ele pode ficar 'angry', em inglês, mas quando está realmente bravo, ele fica 'piktas', em lituano, porque, na sua opinião, o sotaque e a pronúncia da palavra lituana carregam muito mais raiva do que a inglesa", brincou Maja Konkolewska, que analisou a pesquisa.

Para ela, o significado das palavras está muito ligado à história desses idiomas e o passado das pessoas que os falam. "Eu sempre luto para traduzir a palavra 'vulnerável' para o polonês porque não há equivalente direto", disse Konkolewska, cuja origem é polonesa. "Quando ouço as histórias de minha avó sobre a infância dela durante a Segunda Guerra Mundial, me pergunto se não havia espaço para vulnerabilidade na história da Polônia."

Entretanto, os estudiosos ressaltam que sua pesquisa é vítima de um paradoxo. "Nossos resultados sugerem que não existe um conceito único de 'medo', mas não poderíamos ter feito a análise sem começar com o conceito de 'medo' [que temos] e compará-lo com diferentes idiomas", pontuou Jackson, ao The Guardian.

Ainda assim, o profissional explica que sua pesquisa não signficia que tudo o que sabemos sobre outras línguas está errado. “O que estamos dizendo nesse artigo não é para jogar fora dicionários de tradução, mas para não levá-los muito a sério”, disse Jackson.