Rungholt era uma cidade medieval localizada no atual território da Alemanha. Segundo as lendas locais, a região foi engolida pelo Mar de Wadden durante a "enchente de São Marcelo", em 1362, fazendo com que as informações sobre sua população e seus costumes desaparecessem. Pelo menos, até agora.
A partir de escavações nas margens do Mar de Wadden em 2023, uma equipe de pesquisadores conseguiu localizar 2 km de assentamentos medievais na região. Pela interconexão das estruturas identificadas, o grupo de cientistas foi capaz de reconstituir uma área de pelo menos 10 km². O artigo que detalha o processo de recriação foi publicado na revista Scientific Reports.
Cidade perdida sob o mar
A enchente de São Marcelo foi um evento de ciclone extratropical que desencadeou uma poderosa tempestade, devastando as regiões costeiras das Ilhas Britânicas, Países Baixos, norte da Alemanha e Dinamarca. A maré atingiu o pico no dia 16 de janeiro de 1362, dia da festa de São Marcelo – por isso o nome –, resultando na morte de cerca de 25 mil pessoas.
O levantamento geofísico da região, feito a partir do magnetismo, revelou duas anomalias magnéticas, que indicam uma estrutura retangular e uma estrutura semicircular no litoral alemão. Ao escavar o espaço, foram localizados restos do que parecia ser uma antiga igreja.
Comparando os dados encontrados com igrejas medievais conhecidas ainda preservadas na Frísia do Norte, os pesquisadores confirmaram que a estrutura foi de fato uma igreja do período românico, contando com uma torre integrada. “O edifício deve ter sido uma das principais igrejas da região, e provavelmente serviu de lar e local de trabalho para o colégio clerical”, descrevem os especialistas, em nota à imprensa.
Com base nessas observações, os arqueólogos construíram um mapa da antiga Rungholt. Além da igreja central, foram sugeridas as presenças de uma rede de valas de drenagem, um dique marítimo e cerca de 64 estruturas habitacionais.
As escavações também revelaram objetos importados de alta qualidade. O acervo inclui cerâmica vermelha e grés (um tipo de cerâmica) com esmalte de chumbo, caldeirões de bronze fundido, caldeirões de latão martelado, espadas e faiança hispano-mourisca, que devem ser melhor analisados em estudos futuros.
Uma vez que o Mar de Wadden é considerado um Patrimônio da Humanidade, os pesquisadores optaram por não disponibilizar na íntegra o conjunto de informação analisados durante o estudo atual. A decisão tem como objetivo proteger e zelar pelo local das descobertas.