Quânticas

Por Marcelo Lapola

Marcelo Lapola é doutor em Astrofísica e Cosmologia pelo ITA e professor do Centro Universitário da Fundação Hermínio Ometto.

Muito se fala sobre o computador quântico e sua promessa de revolucionar ainda mais a era da informação, exibindo capacidades de processamento e soluções de problemas antes inatingíveis com na computação convencional.

A principal diferença para os computadores convencionais, de linguagem binária, é que em vez de usar dispositivos eletrônicos para armazenar e processar informação digital, átomos individuais e o controle de seus estados de energia são o coração das máquinas quânticas.

Computadores comuns funcionam reduzindo números e instruções a um código binário – uma série de zeros e uns. Tecnicamente, esses zeros e uns representam a passagem ou não de corrente elétrica por um dispositivo chamado transistor. No interior de um microprocessador do seu celular ou computador existem bilhões de transistores que, combinados, formam o que chamamos de portas lógicas.

Cada “dígito binário” 0 ou 1 é conhecido como um bit. Um computador convencional traduz esse código binário para estados físicos, como ligado ou desligado, dentro de seu hardware. Cada distinção do tipo “isso ou aquilo” funcionaria como uma maneira de armazenar dados binários. As sequências de números binários são manipuladas, então, por meio de bancos de portas lógicas, impressos em chips de silício.

A ciência dos qubits

No cerne da computação quântica, estão os qubits (abreviação de quantum bits). Os qubits diferem significativamente dos bits tradicionais da computação clássica, pois exploram as propriedades quânticas da matéria para armazenar e processar informações de maneira revolucionária. A chave para seu poder está na propriedade da superposição.

Um estado de qubit é uma descrição matemática que representa a informação contida em um qubit, a unidade fundamental da computação quântica. Em contraste com os bits clássicos, que podem estar em um estado de 0 ou 1, os qubits podem estar em um estado de superposição, o que significa que eles podem representar uma combinação linear de 0 e 1 ao mesmo tempo.

Em contraste com os bits clássicos, que podem estar em um estado de 0 ou 1, os qubits podem estar em um estado de superposição: uma combinação linear de 0 e 1 ao mesmo tempo. — Foto: Reprodução/itif.org
Em contraste com os bits clássicos, que podem estar em um estado de 0 ou 1, os qubits podem estar em um estado de superposição: uma combinação linear de 0 e 1 ao mesmo tempo. — Foto: Reprodução/itif.org

O estado de um qubit é frequentemente representado usando a notação de Dirac, conhecida como notação de ket (|0⟩ e |1⟩) ou como uma combinação linear (α|0⟩ + β|1⟩), onde α e β são números complexos que descrevem as amplitudes das probabilidades de medir o qubit em 0 ou 1.

Vejamos alguns dos estados mais comuns de um qubit:

  1. Estado |0⟩: Isso representa um qubit no estado "0" clássico. A probabilidade de medir o qubit no estado |0⟩ é 1, enquanto a probabilidade de medir no estado |1⟩ é 0.
  2. Estado |1⟩: Isso representa um qubit no estado "1" clássico. A probabilidade de medir o qubit no estado |1⟩ é 1, enquanto a probabilidade de medir no estado |0⟩ é 0.
  3. Estado de superposição: Um qubit pode estar em um estado de superposição, que é uma combinação ponderada dos estados |0⟩ e |1⟩. Por exemplo, α|0⟩ + β|1⟩, onde α e β são números complexos, descreve um qubit em um estado de superposição. Isso significa que, quando medido, o qubit terá uma probabilidade α² de ser medido no estado |0⟩ e β² de ser medido no estado |1⟩.

A superposição é um dos conceitos centrais da mecânica quântica e é a base dos qubits. Enquanto os bits tradicionais podem ser 0 ou 1, os qubits têm a notável capacidade de existir em múltiplos estados simultaneamente.

Imagine um qubit como uma bola que está em vários lugares ao mesmo tempo, representando 0 e 1 concomitantemente. Isso oferece uma maneira eficiente de armazenar informações. O estado de superposição permite que os qubits processem uma grande quantidade de informações paralelamente, o que é impossível para os bits clássicos.

Quando temos dois qubits combinados, os estados possíveis são quatro: |0 0⟩, |0 1⟩, |1 0⟩, |1 1⟩. Com quatro probabilidades, uma para cada estado. Para três qubits combinados, teremos oito combinações possíveis, e assim por diante.

A combinação dos estados e suas probabilidades representam no final das contas possibilidades de armazenamento e processamento de informações. Extrapolando essa progressão de estados, se temos 500 qubits combinados em um computador quântico, teremos um total de 2 elevado a potência 500 — número maior que todos os átomos do Universo.

No último dia 24 de outubro, a startup Atom Computing, dos EUA, anunciou seu novo protótipo, com 1.000 qubits. Vale lembrar que a IBM promete lançar em breve seu novo computador quântico, de inacreditáveis 4.000 qubits!

Entrelaçamento quântico

O entrelaçamento é outra propriedade quântica intrigante no mundo dos átomos e partículas que desafia a lógica clássica. Quando qubits são entrelaçados, eles se tornam interdependentes de uma maneira que não tem paralelo na física clássica.

Mesmo que estejam separados por grandes distâncias, o estado de um qubit pode ser instantaneamente influenciado pelo estado do outro. Isso cria uma rede de conexões quânticas que permite a comunicação e a computação a níveis anteriormente inimagináveis.

Possibilita, por exemplo, o teletransporte. Aliás, um dos primeiros algoritmos que aprendemos quando estudamos computação quântica é o algoritmo do teletransporte. Um estado que existe apenas no laboratório A, quando combinado com um estado entrelaçado (chamamos de estados de Bell), irá “aparecer” no laboratório B após algumas operações e as medições clássicas no laboratório A.

Engenharia quântica

A construção de um computador quântico é uma tarefa extraordinariamente desafiadora, envolvendo tecnologia de ponta e mentes brilhantes. Manter os qubits em estados quânticos delicados requer técnicas avançadas, muitas vezes envolvendo criogenia, resfriando os qubits a temperaturas próximas ao zero absoluto para minimizar interferências do ambiente.

Os principais tipos de computadores quânticos em funcionamento incluem os baseados em circuitos supercondutores e em armadilhas de íons. Nesse último caso, um laser é o responsável por mudar os estados dos íons.

Circuitos supercondutores usam pequenos anéis supercondutores para armazenar e processar qubits, enquanto as armadilhas de íons usam íons aprisionados em campos magnéticos para realizar cálculos quânticos. Ambos têm suas vantagens e desafios, mas estão pavimentando o caminho para a revolução quântica.

Empresas como IBM, Google e startups inovadoras estão liderando o desenvolvimento de computadores quânticos, oferecendo acesso a essas máquinas por meio da nuvem.

Na prática

A computação quântica promete revolucionar diversas áreas, desde a criptografia até a pesquisa de medicamentos e otimização de cadeias de suprimentos. Por exemplo, a quebra de criptografia atualmente segura em computadores quânticos ameaça a segurança de informações confidenciais.

Além disso, a simulação quântica permite a exploração de fenômenos complexos, como a interação de partículas subatômicas, impulsionando avanços na física e na química.

A computação quântica está prestes a transformar nosso mundo de maneiras que mal podemos imaginar. E essa geração tem grande probabilidade de ver essa revolução tecnológica.

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