Saúde

Por Caroline Dalton* | The Conversation

Estima-se que cerca de 3% das pessoas no Reino Unido enfrentam a Covid longa – sintomas persistentes e duradouros após uma infecção por Covid-19.

A Covid longa engloba uma variedade de problemas de saúde que podem começar mesmo após uma infecção por Covid-19 leve. Alguns desses sintomas incluem fadiga extrema, falta de ar, dores musculares e perda do olfato.

Para cerca de 50% dos pacientes com Covid longa, seus sintomas também se enquadram nos critérios para um diagnóstico de encefalomielite miálgica (EM), ou síndrome da fadiga crônica, uma doença neuroimune caracterizada por falta de energia, fraqueza e dor muscular, disfunção cognitiva e disautonomia (ou disfunção autonômica), que afeta a pressão arterial e a frequência cardíaca.

Uma característica fundamental da EM é a "mal-estar pós-esforço" (PEM, na sigla em inglês para “post-exertional malaise”). Isso se refere a uma piora dos sintomas que ocorre cerca de 24 a 48 horas após qualquer forma de esforço – seja físico, cognitivo ou emocional. A PEM pode levar dias ou semanas para diminuir.

A PEM continua sendo uma das características mais debilitantes, mas menos compreendidas, tanto da EM quanto da Covid longa. No entanto, uma nova pesquisa pode apontar uma explicação provável para o motivo pelo qual a atividade física em particular piora os sintomas da Covid longa. O estudo descobriu que pessoas com Covid longa apresentam alterações na estrutura muscular.

Para conduzir seu estudo, os pesquisadores analisaram biópsias musculares e amostras de plasma sanguíneo de 25 pessoas com Covid longa e 21 pessoas que tiveram Covid-19, mas não apresentaram um quadro prolongado. Os participantes de ambos os grupos tinham, em média, 41 anos. Houve uma divisão de 48% a 52% entre homens e mulheres.

As amostras de sangue e músculo foram coletadas antes e depois de um teste controlado de ciclismo. Os participantes pedalaram por aproximadamente 15 minutos, começando devagar e aumentando gradualmente a intensidade.

Durante o teste de ciclismo, aqueles com Covid longa apresentaram menor força muscular e menor absorção de oxigênio em comparação com os participantes saudáveis – apesar de colocarem a mesma quantidade de esforço. Esses resultados ecoam as descobertas de estudos anteriores, sugerindo que as pessoas com Covid longa têm capacidade de exercício significativamente reduzida.

Quando os pesquisadores analisaram as amostras musculares dos participantes, descobriram que aqueles com Covid longa tinham uma maior proporção de fibras musculares glicolíticas de contração rápida. Essas fibras musculares podem trabalhar com alta intensidade em "erupções" curtas; porém, são altamente fadigáveis, porque têm menos mitocôndrias (organelas que fornecem às células a energia de que precisam para funcionar corretamente).

Os pesquisadores realizaram testes adicionais nas mitocôndrias dessas fibras. Eles descobriram que o exercício reduzia a função mitocondrial nos portadores de Covid longa – indicando que, além de terem uma capacidade reduzida para o exercício, seus tecidos musculares haviam sofrido danos durante o teste de exercício.

Testes em moléculas no músculo e plasma também revelaram que pessoas com Covid longa tinham níveis mais baixos de moléculas vitais necessárias para a glicólise, o processo que as mitocôndrias usam para fornecer energia às células.

Não é a primeira vez que a disfunção mitocondrial foi implicada em uma doença com PEM. Na verdade, isso foi proposto como o mecanismo subjacente na EM há mais de 40 anos.

Se as mitocôndrias nos músculos estiverem disfuncionais, isso significa que as células musculares não produzem energia suficiente para atender às demandas do corpo. Isso pode explicar por que pessoas com Covid longa têm sintomas piores após fazerem exercícios.

'Microcoágulos' musculares

Em seguida, os autores estudaram se havia aglomerados de proteínas mal dobradas presentes nas amostras musculares.

Estudos anteriores mostraram que esses aglomerados, chamados "microcoágulos", são encontrados em níveis elevados no plasma de pessoas com Covid longa. Propôs-se que os microcoágulos possam bloquear os capilares, causando danos à medida que o sangue retorna aos tecidos. Isso também pode causar danos às mitocôndrias.

Os autores mostraram que pessoas com Covid longa de fato tinham mais microcoágulos em seus músculos em comparação com as amostras de controle. O número de microcoágulos também aumentou após o exercício em todos os participantes. No entanto, os cientistas não encontraram evidências de que os microcoágulos estavam bloqueando capilares.

Por fim, os pesquisadores examinaram quais células imunológicas estavam presentes no tecido muscular. Eles encontraram um aumento no número de macrófagos e células T, que ajudam na reparação tecidual, nas amostras daqueles com Covid longa – mesmo antes de se exercitarem. Isso indica que os portadores de Covid longa têm células imunológicas localmente ativadas em seus tecidos musculares em resposta a danos em tecidos.

Sabe-se que as mitocôndrias podem causar e também ser danificadas pela inflamação (que pode ser causada por um sistema imunológico hiperativo). Isso pode ser outra razão pela qual as mitocôndrias dos portadores de Covid longa são disfuncionais.

Mirando nas mitocôndrias

Esse estudo apoia um corpo crescente de pesquisas que identificaram consideráveis anormalidades na função metabólica, muscular e imunológica de pessoas com Covid longa (e, por extensão, pessoas com EM). Ele também sugere que mirar nas mitocôndrias pode ajudar a melhorar os sintomas.

De maneira promissora, já foi mostrado que muitos compostos podem afetar positivamente a função mitocondrial. Alguns deles estão disponíveis sem receita médica no Reino Unido, como a coenzima Q10 (que nosso corpo produz naturalmente). Mas serão necessários ensaios controlados por placebo para verificar se esses compostos têm algum efeito sobre os sintomas do Covid longa.

Essas descobertas também destacam a importância de se ter cautela ao projetar estratégias de reabilitação para pessoas com Covid longa.

Programas tradicionais funcionam com base na premissa de que aumentos graduais no esforço e na dificuldade constroem resiliência e capacidade de exercício. Mas, para pessoas com Covid longa, o oposto é verdadeiro. Este artigo recente descobriu por que isso pode acontecer, mostrando que, para aqueles com Covid longa, passar dos limites de suas capacidades provocará danos mitocondriais, reduzindo a resiliência e provocando uma recaída de sua condição.

Essas descobertas são essenciais ao considerar recomendações para estratégias de reabilitação ou retorno ao trabalho para quem tem Covid longa.

* Caroline Dalton é professora associada de neurociência e genética da Universidade Sheffield Hallam. Este texto foi originalmente publicado em inglês no site The Conversation.

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