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Por Joana Cannabrava; Joana Cannabrava


Você já parou para repensar no papel dos influenciadores que você segue durante essa pandemia de coronavírus? Eu já, muitas e muitas vezes ao longo desse período de isolamento social. Já me reencontrei com o trabalho de algumas pessoas que estão arrasando, repensei o de outras que estão perdendo a oportunidade de fazer diferença e deixei de seguir algumas pessoas que perderam a credibilidade pra mim.

Me ver inserida nesse mercado me faz ter um olhar ainda mais crítico sobre esse debate. Conheço de perto a importância de ser coerente, verdadeira e responsável. Os profissionais que produzem conteúdo tem o poder de trazer muitas ideias para o debate. Algumas pessoas brilham ao fazer isso de uma maneira inteligente e leve, outras nem tentam.

Assim como muitas seguidoras e amigas, estou com menos paciência para discursos alienados. O problema não é postar um look ou uma foto feliz. É esquecer — convenientemente — que estamos inseridos num contexto desafiador. Em que todos estão sofrendo com a tentativa de isolamento social. É desafiador pra todos produzir e ser criativo de casa, mas esse problema é comum a todos os produtores de conteúdo. É natural que a audiência se incomode com aqueles que se acham melhor que os outros e optam por atalhos ou jeitinhos para produzir conteúdos mais relevantes fora de casa.

Joana Cannabrava: o papel do influencer nos tempos de covid-19 (Foto: Leticia Nunes) — Foto: Glamour
Joana Cannabrava: o papel do influencer nos tempos de covid-19 (Foto: Leticia Nunes) — Foto: Glamour

Vivemos num tempo de tantas reflexões urgentes. Que vão impactar a maneira que consumimos, pensamos e vivemos. Fazer isso de forma alienada ou romantizando um vírus não faz sentido no meu olhar. Isso vem sendo debatido em todo o mundo. Não seria diferente aqui, todo mundo pode repensar quem quer seguir ou quem vai te influenciar verdadeiramente.

Confesso que não amo a palavra influenciador porque nem todo influenciador que tem muitos seguidores de fato acaba influenciando. Afinal, influenciar tem a ver com acreditar e ter credibilidade, isso independe do número. Isso tem mais a ver com o perfil de comportamento da pessoa e ao meu ver, nesse momento isso está mudando aqui e agora, na nossa frente. Enquanto estamos conversando sobre isso.

Cada vez menos pessoas conquistam meu like, minha atenção e confiança. Mas as que chegam nesse lugar, tem cada vez mais crédito comigo. Em geral, esses perfis estão tentando fazer alguma diferença, do seu jeitinho. Já seguia muitas pessoas lutando por um mundo melhor em meio a suas próprias narrativas, com humor, beleza e afins. Mas agora noto que alguns perfis que construíam a vida idealizada também se abriram pra trazer mais e mais informação e consciência.

Entre os que me influenciavam e eu admirava antes e os que faço agora existe uma palavra em comum, que faz todo sentido pra mim: coerência. Além de um exercício que busca mais consciência do todo. Cada uma a sua maneira, com seu CEP e conta bancária. Noto que não se alienar, entender seus privilégios e enxergar o seu lugar do sistema, é a porta de entrada para o novo universo da produção de conteúdo até mesmo no mercado de luxo.

Joana Cannabrava: o papel do influencer nos tempos de covid-19 (Foto: Leticia Nunes) — Foto: Glamour
Joana Cannabrava: o papel do influencer nos tempos de covid-19 (Foto: Leticia Nunes) — Foto: Glamour

Não dá mais para justificar qualquer ímpeto egoísta baseado no argumento de sermos autênticas. Autenticidade tem a ver com sermos quem somos, não com parecermos com o que vai dar mais engajamento. Precisamos parar de sermos uma comunidade caçadora de likes e seguidores a qualquer custo. Trabalhar com grandes marcas e ter o trabalho reconhecido tem mais a ver com ter credibilidade, posicionamento e fazer a diferença. Isso fica mais e mais claro durante esse momento. Não tem como produzir conteúdo pra pessoas tão diversas pautada apenas no universo do próprio umbigo. É preciso abrir os olhos para as diferenças.

Não dá mais para invalidar debates coletivos pautada apenas na própria experiência individual privilegiada. Não dá pra romantizar desigualdade e ou a falta de oportunidade enquanto tantas vidas estão em jogo. Podemos estar no mesmo mar revolto, mas não no mesmo barco. Alguns estão em iates, outros em barcos menores, alguns em botes salva vidas e outros tentando se agarrar em algo pra não se afogar. É possível produzir conteúdo leve e inspirador, mas não dá para agradecer as mudanças que o vírus veio trazer, não quando vivemos no país com a gestão de pandemia mais controversa do mundo, independente de lados.

É preciso também reconhecer quais debates são coletivos e quais são individuais. É preciso reconhecermos os debates de luta por liberdade e equidade. O machismo, o racismo, a homofobia e outras lutas coletivas são urgentes e necessárias. Precisamos ver produtores de conteúdo mais conscientes disso. E isso não quer dizer que não teremos nossas dores. Só quer dizer que não vamos usá-las para invisibilizar os debates coletivos. Podemos fazer nossa parte para dar lugar e voz pra debates que extrapolam nossos limites. Podemos tomar atitude e fazer o mundo ser mais consciente ao dar voz para mais gente.

Num mundo onde os perfis que mais crescem são muito parecidos, incríveis são aqueles que chegam no topo e dão espaço para mais diversidade e representatividade. Quem tem poder de informar tem muito. Quem pode furar bolhas e ultrapassar recortes, pode construir um mundo mais desperto e consciente.

Estamos então usando nossa voz pra isso? Estamos gerando interesse em pautas importantes para que o mundo realmente mude e que realmente haja um novo normal?

Todo o conteúdo e informação pode ser feito de uma forma leve, plástica e bonita. Tenho tantos exemplos na ponta da língua, mas hoje não quero falar de casos específicos. A mudança pode vir com memes, com um visual plástico bonito e até mesmo com humor. Ninguém tá dizendo que precisa ser pesado, mas não dá mais pra ser cego.

Joana Cannabrava: o papel do influencer nos tempos de covid-19 (Foto: Divulgação ) — Foto: Glamour
Joana Cannabrava: o papel do influencer nos tempos de covid-19 (Foto: Divulgação ) — Foto: Glamour

Tanta gente fazendo um trabalho lúcido, bonito e incrível, honrando a responsabilidade coletiva de comunicar para diversos universos. Tanta gente extrapolando a expectativa da narrativa única e repensando conteúdos para fazermos pensar. Para nutrirmos nosso próprio senso crítico. É mais fácil escolher uma fada sensata pra seguir e não ter que pensar, mas na prática não funciona. Precisamos nos reconhecer como parte do todo, nos conhecer e nos dar o benefício de refletir, para assim existirmos no mundo.

Para mim o novo normal só existirá quando nos dermos tempo para parar para pensar. O conteúdo pode ser leve e plástico, mas pra mim não dá mais pra estar 100% do tempo alienado. Eu quero coerência, quero um ponto de vista consciente para me influenciar. E se não for pedir muito, quero ver gente que busca fazer diferença no mundo em que vivemos crescer. Quero ver o mundo pós corona se tornar um lugar onde vamos ter espaço pra diferenças, pra que sejamos mais autênticos e menos obrigadas a nos encaixar. O valor das coisas que realmente importam parece muito além de coisas que a maioria das pessoas não pode comprar. Luxo pra mim passa a ter mais a ver com qualidade de vida e a real percepção de saúde mental, física e emocional do que com ostentar.

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