"Estou sonhando com algumas personagens de Wagner, mas meu papel principal é outro”, diz a soprano búlgara Sonya Yoncheva. Para ela, o cargo primordial consiste em se manter “sempre inspirada para criar e conectada ao máximo com a nova geração”. É assim que vem conquistando cada vez mais reconhecimento ao redor do mundo e impulsionando a renovação da ópera para o público contemporâneo.
Prova disso é que Yoncheva acaba de receber o prêmio Golden Century, a mais alta distinção do Ministério da Cultura de seu país, em reconhecimento ao seu impacto na música e na cultura. Além disso, desempenha os papéis de Embaixadora da Boa Vontade da Unicef, promovendo direitos das crianças ao redor do mundo, e de Embaixadora Rolex, representando a marca que compartilha de sua paixão pela excelência.
Suas apresentações em São Paulo comemoram a reabertura doTeatro Cultura Artística após um incêndio ocorrido há mais de 15 anos. Renovada para se dedicar exclusivamente à música, a casa de salões cinquentistas e enorme painel de Di Cavalcanti recebe uma mistura de peças de Puccini, Verdi e seus contemporâneos.
“A ópera fala sobre tanta coisa bonita. Podemos aprender sobre valores, ética, amor. Estou empenhada em garantir que todos voltem para casa com muita emoção”, promete a soprano.
MARIE CLAIRE: Você já interpretou papéis muito populares, como Gilda, de Rigoletto, Mimi, de La Bohème, e Violetta, de La Traviata. Como deixa sua marca em personagens que já foram interpretadas tantas vezes?
SONYA YONCHEVA: Tento ser o mais honesta possível com o público. Quando você é sincera e transmite emoções verdadeiras, a voz vem naturalmente. Isso é muito importante porque, após uma apresentação, as pessoas realmente sabem se receberam a dose certa de emoção.
MC: Você canta desde criança. Qual a maior mudança que vivenciou na sua profissão?
SY: Poder viajar e espalhar arte por todo o mundo. Posso acordar em Omã, ir para a Argentina e então fazer um concerto em Nova York. É encantador poder alcançar públicos globalmente.
MC: Qual a sua opinião sobre lives de ópera?
SY: Durante a pandemia fiquei feliz por poder me comunicar, mas foi triste cantar para máquinas em espaços vazios. As salas de concerto são lugares sagrados, feitos especialmente para a música, projetados acusticamente para suportar apresentações sem microfones. Não é a mesma coisa nos ouvir através de computadores. A melhor experiência é estar no teatro e vivenciar sua magia ao vivo, com seus próprios olhos e ouvidos.
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MC: Como mãe de dois, como tem sido equilibrar a maternidade e a carreira de soprano?
SY: Extraordinário, a melhor experiência da minha vida. A maternidade deu novas cores até ao meu canto. Ter uma família quando parte da sua vida é caótica e reluzente – e às vezes até falsa – te permite manter os pés no chão e proporciona algo muito estável e especial. Para mim, é a combinação perfeita.
MC: Considera importante que seus filhos cresçam em um ambiente artístico?
SY: É importante para todas as crianças, não só as minhas. A arte é uma maneira especial de expressar sentimentos e emoções quando não conseguimos encontrar palavras. É um processo de cura.
MC: Você é Embaixadora da Boa Vontade da Unicef e recentemente anunciou uma nova iniciativa musical para jovens na Bulgária. Por que é importante dar acesso à cultura à nova geração?
SY: Porque significa melhor saúde mental, uma infância melhor e uma sociedade melhor. Ensina as crianças a trabalhar em equipe, se comunicar, se unir e encontrar paz de espírito.
MC: A ópera é uma forma de arte exigente. Como mantém a saúde vocal e a resistência física?
SY: Cantar é uma atividade que envolve corpo e mente. Preciso estar em um estado de espírito tranquilo e meu corpo precisa estar tonificado para que eu possa enfrentar as dificuldades de estar no palco, usar figurinos pesados, mover-me e fingir que estou matando alguém [risos].
MC: Moda e estilo desempenham um grande papel em suas performances. Você se envolve nessa parte?
SY: Com certeza. Amo a moda e a considero uma forma de arte. Gosto de me expressar de diferentes maneiras, não apenas com minha voz, mas também por meio de roupas e acessórios.
MC: Como ser embaixadora da Rolex complementa sua imagem e sua presença no mundo da ópera?SY: A Rolex é uma grande família de pessoas interessantes e dedicadas em suas áreas de atuação. Todos os embaixadores que conheci nos últimos 15 anos são extremamente apaixonados pelo que fazem, e a Rolex me apoia como alguém que sonha com um mundo melhor.
MC: Qual foi sua experiência mais memorável como embaixadora da Rolex?
SY: Tive a chance de conhecer pessoas muito interessantes. Recentemente, jantei com Roger Federer e sua família em Londres. Conversar com ele me fez ver que a vida de um atleta é muito parecida com a de uma diva da ópera. É incrível estar em contato com pessoas que entendem o quão grandes são em suas áreas, mas que são simples no dia a dia.
MC: Seu novo álbum, que sai neste mês, é sobre George Sand. Por que a admira?
SY: Ela era uma mulher especial. Uma escritora extremamente talentosa que apreciava as artes, estava interessada em como a França se desenvolveria e era totalmente dedicada a seu papel na sociedade. Estava rodeada de artistas, como Chopin, Liszt e Pauline Viardot, que dedicaram peças a ela. Achei curioso imaginar estar em sua pele, em seu círculo, rodeada por seus amigos e fazendo a música que amava.
MC: Como vê o atual estado da ópera e sua ressonância com o público contemporâneo?
SY: Nos últimos anos temos falado sobre como alcançar o público mais jovem e fazer da ópera uma forma de arte contemporânea. Não precisamos pensar nela como arte antiga. Hoje temos a possibilidade de falar a linguagem da juventude através de meios digitais, mapeamento, luzes, projeções 3D... é hora de a ópera ser algo “uau”.
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