Ponto de vista

Por redação Marie Claire — São Paulo

O post de Iza em que anuncia o término com o jogador Yuri Lima, com quem terá uma filha, já acumula aproximadamente 8 milhões de curtidas e quase 500 mil comentários de apoio à cantora. “Ele me traiu”, contou a carioca, grávida de 6 meses, na noite dessa quarta-feira (11), após descobrir que ele mantinha conversas e vídeo-chamadas de cunho sexual com uma ex-namorada. O caso gerou uma avalanche de engajamento. Afinal, que mulher - famosa ou não-, nunca viveu uma experiência traumática em um relacionamento amoroso com um homem?

Estamos diante de uma mulher bonita, rica, famosa e no auge da carreira profissional, expondo as dores de uma traição cometida por um jogador de futebol do Mirassol, time da Série B, um anônimo antes do namoro. Mas o que acontece quando uma figura tão influente e venerada quebra o silêncio sobre esse sofrimento? E o que significa quando essa violência ocorre justo durante uma gestação - período de tamanha potência e, ao mesmo tempo, vulnerabilidade para a mulher?

Para Maria Carolina Medeiros, professora da Fundação Getúlio Vargas Comunicação Rio e pesquisadora de socialização feminina, o primeiro comentário que vemos surgir nesses momentos e que precisamos parar de reforçar é: se até uma mulher linda e famosa como a Iza foi traída, o que será das demais?

“Trair alguém é uma decisão de quem trai, não tem a ver com o outro merecer ou não. Essa ideia acaba reforçando o estereótipo de que se a mulher é traída, é porque não deu conta de ‘segurar o homem’. A objetificação da mulher pelo homem é muito presente nas relações hétero. Está alicerçada na ideia de que a mulher serve a ele, de que existe a partir dele; ele é Sujeito, ela é o Outro, como ensina Simone de Beauvoir. Isso às vezes é bem evidente, noutras fica adormecido e aparece em momentos em que a mulher destoa do que se espera dela: no corpo - a mulher que engorda, que envelhece, que engravida, que está puérpera, que adoece -, no comportamento - a que questiona, que desobedece, que ganha mais que o homem, que não aguenta desaforo calada etc”, destaca Medeiros.

O caso de Iza é uma constatação de como persiste na sociedade patriarcal o modelo de masculinidade pautada no sentimento de superioridade e legitimidade natas, diz a promotora do MP-SP, Silvia Chakian, colunista de Marie Claire. “Considera a mulher a partir da ótica utilitária, de um corpo à disposição dos homens, seja para dar prazer, seja para procriar. Está aí um ponto em que evoluímos pouco, quase nada mesmo, apesar da revolução de direitos dos últimos anos. Então vemos esses relacionamentos ainda permeados pela cultura de desrespeito às mulheres, que as reduz a um objeto descartável, que vale na proporção do que é útil.”

Sobre a violência perpetuada durante a gestação, a promotora lembra que a gravidez é considerada um fator de risco no formulário nacional do Conselho Nacional de Justiça para mulheres em situação de violência. “Por mais que o caso da Iza não seja de violência física, é violência psicológica e pode-se fazer esse paralelo”, afirma Chakian.

"Na nossa cultura, homens aprendem a amar muitas coisas e as mulheres, a amar os homens", define Valeska Zanello, psicóloga, filósofa e coordenadora do grupo de estudo Saúde Mental e Gênero, do Departamento de Psicologia Clínica da Universidade de Brasília (UnB). Essa condição é um aparato que condena as mulheres a uma dependência emocional, que acaba em submissão e as coloca enquanto objeto da masculinidade – e reféns de maus comportamentos. Afinal, mesmo com mais liberdade, muito da vida das mulheres ainda gira em torno das relações amorosas — principalmente as heterossexuais monogâmicas.

Zanello utiliza a metáfora da “prateleira do amor”, mediada por um ideal estético branco, loiro, magro e jovem, para ilustrar o dispositivo amoroso ao qual as mulheres são submetidas. A chance de ser escolhida é a medida do sucesso feminino. “Não importa o quão bem sucedida na carreira profissional, vão perguntar: ‘é casada?’”, destaca.

“As mulheres negras estão no pior lugar, por isso fala-se tanto na solidão da mulher negra. Mas também a mulher velha, com deficiência, indígena. Quanto pior o lugar, mais você é visto sob a égide da objetificação sexual, e não é digna de afeto. Mas no fundo a prateleira não é boa pra nenhuma de nós porque ela elege o homem como avaliador físico e moral das mulheres. Qualquer ‘perebado’ se acha no direito de nos avaliar física e moralmente. É aquele cara de barriga gigante na praia chamando a mulher de baleia”, continua.

A atriz Zezé Motta se manifestou sobre o episódio de Iza em um longo texto que publicou no Instagram em solidariedade à cantora. “Confesso que minha voz embargou, porque, no pesar de uma mulher tão potente, por quem tenho tanta admiração, vejo uma mulher, uma mãe que se prepara para gerar o fruto de um amor, uma boa nova, um novo começo. A maternidade para a mulher é uma plenitude, talvez o momento em que nos sentimos mais completas e, ao mesmo tempo, repletas de dúvidas e anseios”, escreveu.

“Ressignificar a solidão da mulher negra vai além das vivências nas relações amorosas; é sobre uma vivência de exclusão em uma sociedade que insiste em ser machista, patriarcal e escravocrata. Aqui, é importante destacar a ‘Dororidade’, um conceito criado por Vilma Piedade. Dororidade é a solidariedade entre mulheres negras que compartilham dores semelhantes. É um termo que une as palavras ‘dor’ e ‘sororidade’, evidenciando que a união e o apoio entre mulheres negras são fundamentais para enfrentar as adversidades e ressignificar suas experiências. É através da dororidade que encontramos força e coragem para seguir em frente, sabendo que não estamos sozinhas em nossas lutas”, continua.

Zanello ressalta a importância de olharmos para a masculinidade aprendida pelos homens no Brasil. Segundo ela, a principal emocionalidade demandada deles é a capacidade de objetificar sexualmente uma mulher e exibir isso aos seus pares masculinos.

“Se na prateleira do amor os homens são eleitos como avaliadores de mulheres, eles lucram com a vulnerabilização das mulheres no dispositivo amoroso. Qualquer ‘perebado’ tem chance de ter uma mulher. Essa demonstração de hiper virilidade sexual, de comer várias mulheres, não só é perdoável, como ainda é chancelada por estar sendo um ‘verdadeiro homem’”, afirma a pesquisadora.

A escritora e advogada Ruth Manus, em texto publicado no Instagram, afirma que “desde cedo as garotas aprendem a mirar baixo, isso vale para empregos, sonhos e namorados”.

“Mulheres fabulosas se convencem de que os medianos (e muitos abaixo do mediano) bastam para elas- ele me trata bem, ele é um cara legal, ele é suficiente. O problema desse mecanismo é que isso gera neles a certeza de serem mais do que são. De merecerem o que na realidade era genuinamente incompatível com eles. E de merecerem, inclusive, mais. Porque uma mulher fabulosa não basta para ele: o distorcido mediano que enxerga um gigante no espelho- mas que no fundo sabe ser pouco. A mistura entre o recalque e a ganância não raramente resulta nisso. Um teco-teco nunca vai conseguir acompanhar um boeing. E esse teco-teco é capaz de passar uma vida sem se enxergar como o teco-teco que é, se comportando como a aeronave potente e espaçosa que nunca será, quando na realidade deveria ser grato por alguém reduzir a velocidade para tentar voar ao seu lado”, escreveu na rede social.

E qual o impacto de casos de traição como de Iza e Luísa Sonza, celebridades que escolheram expor um sofrimento até pouco tempo mantido em silêncio?

Renata Correa, ativista feminista, escritora e roteirista, diz que o esperado das mulheres que são traídas é a “contenção, o recato e o perdão” e enxerga como conquista a fala pública sobre o rompimento dos acordos afetivos e amorosos com homens. “Inverte uma lógica injusta onde a culpa e a vergonha recai sobre a mulher traída e que o homem é apenas pegador, machão e que isso seria natural do comportamento masculino. Verbalizar a dor e poder reagir a um comportamento desleal é legítimo”, afirmou a Marie Claire, em setembro de 2023, quando Luísa Sonza anunciou o término com Chico Moedas para o Brasil inteiro no programa matinal de Ana Maria Braga.

Já para Maria Carolina Medeiros, a exposição nas redes sociais beneficia o homem que traiu: “[Yuri Lima] É um jogador inexpressivo que agora vai ficar famoso e ganhar seguidores diante da repercussão do caso. Temos de esperar para ver, mas sou capaz de apostar que a culpa vai recair toda sobre a amante - que obviamente teve um comportamento desprezível também -, e a conduta dele vai acabar atenuada. No fim, os homens sempre têm mais uma chance de errar”.

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