Um veículo que transportava embalagens com material radioativo foi furtado em São Paulo, alertou a Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN) nesta quinta-feira (4). A carga levava cinco embalagens, sendo que quatro estavam exauridas (sem teor radioativo), enquanto outra continha germânio, elemento de baixo teor radioativo, informou a CNEN.
A CNEN pediu que, caso alguma pessoa ache a carga, que contate imediatamente a instituição pelos telefones (21) 98368-0734 ou (21) 98368-0763 e também à Polícia.
Dalton dos Anjos, coordenador de medicina nuclear da Dasa, explica que o germânio é utilizado para gerar o gálio-68, uma substância líquida que é injetada na veia de pacientes com câncer para ajudar os aparelhos de PET-Scan e tomografia a identificar tumores, especialmente em exames de próstata.
"Esse elemento é normalmente utilizado em exames de próstata. O gálio é injetado na veia da pessoa e, através da circulação sanguínea, ele se liga aos tumores da próstata, que serão lidos pelo PET-Scan e que são transformados em exames de imagem", disse Anjos
Dessa forma, apesar de ser um elemento radioativo, Anjos explica que o contato com o germânio e o gálio não apresentam grandes riscos à saúde, devido ao seu baixo teor de radiação.
“A radiação do germânio ou do gálio não vai causar nenhum dano maior à pessoa que entrar em contato com ele, ela é muito pouco danosa à saúde pública. O produto é tão pouco danoso à saúde que é injetado na veia das pessoas”, disse Anjos.
O especialista ainda explica que o germânio é uma fonte selada — quando o material radioativo é totalmente encapsulado — em pastilhas ou cilindros, e que é necessário misturá-lo com outras substâncias para gerar o gálio-68.
Caso uma pessoa se exponha ao germânio ou ao gálio, os níveis de radiação no corpo do indivíduo seriam similares aos de alguém que tivesse feito uma série de exames raio-X, representando um risco baixíssimo à saúde pública e ao meio-ambiente, segundo o especialista.
Como a carga foi roubada?
Segundo a CNEN, a empresa Medical ALD sublocou um serviço de transporte das cargas para a companhia R2 Pharma e tinha como destino as cidades de Curitiba e Blumenau.
O Valor entrou em contato com a Medical ALD e a R2 Pharma, mas não obteve resposta até o momento de publicação desta reportagem. O espaço segue em aberto.
A Polícia Civil está investigando o caso, que foi registrado inicialmente como furto de veículo no 49º Distrito Policial (DP), São Mateus, na Zona Leste da capital. O crime teria ocorrido após o motorista da companhia deixar o carro que transportava as cargas, um Volkswagen Saveiro, em um pátio que não era o indicado para o veículo ficar abrigado durante à noite, com segurança.
"Esclarecemos que o material radioativo furtado com o veículo está acondicionado em embalagens de chumbo que o blindam e evitam qualquer irradiação para o ambiente. No entanto, a manipulação inadequada pode vir a causar danos à saúde", disse a CNEN em nota
A diferença entre o germânio e o césio-137
Em setembro de 1987, aconteceu o acidente com o Césio-137 em Goiânia. O manuseio indevido de um aparelho de radioterapia abandonado, onde funcionava o Instituto Goiano de Radioterapia, gerou o acidente que contaminou diversas pessoas e o meio ambiente da região com o elemento radioativo.
Com a violação do equipamento, foram espalhados no meio ambiente vários fragmentos de 137Cs, na forma de pó azul brilhante, provocando a contaminação de diversos locais, especificamente naqueles onde houve manipulação do material e para onde foram levadas as várias partes do aparelho de radioterapia.
Diferentemente do césio, o germânio e o gálio apresentam um teor de radioatividade muito mais baixo. De acordo com Anjos, um gerador de gálio novo normalmente contém de 20 a 50 Mega becquerel (Mbq), unidade de radioatividade, enquanto o césio que gerou o acidente em Goiânia continha radioatividade de 50.9 Tera becquerel (Tbq) — cerca de mil vezes mais radiação do que um Mbq.
Além dos níveis menores de radiação, tanto o gálio quanto o germânio apresentam uma meia-vida muito menor do que o césio, de 68 minutos, 288 dias e 33 anos, respectivamente.
*Estagiário sob a supervisão de Diogo Max