A desistência do presidente dos Estados Unidos Joe Biden de concorrer à reeleição deixou uma lição importante para o mundo: é preciso saber a hora de parar. Foi necessária uma triste sequência de atos falhos, de demonstrações de fraqueza e de pressão pública para que Biden finalmente admitisse que havia chegado a hora de encerrar um ciclo.
Essa lição se encaixa perfeitamente em nossa vida pessoal e também no mundo corporativo. Fechar um ciclo pode e deveria ser motivo de orgulho, especialmente se tivermos a consciência de que estamos deixando legados valiosos. Esses legados podem incluir sucessores bem formados, negócios mais robustos ou uma sociedade mais estruturada.
A consciência sobre a hora certa de desocupar um espaço nos permite abrir novas portas, com mais oportunidades e com a certeza de que fizemos a diferença. Infelizmente, o que vimos nos últimos meses nos Estados Unidos foi o exemplo de uma liderança que, ao insistir em prolongar seu ciclo, teve sua imagem gradualmente deteriorada. Esta situação é um alerta sobre a responsabilidade de reconhecermos o momento de transição.
Existem três principais responsabilidades a serem consideradas nesse processo: o próprio indivíduo deve ser capaz de perceber quando seu momento chegou, o que envolve uma avaliação honesta de seu desempenho atual e das possibilidades futuras; aqueles que estão mais próximos devem ter a coragem e a honestidade de alertar sobre a necessidade de mudança; e aqueles que estão um pouco mais distantes, mas ainda assim envolvidos, também devem se manifestar e contribuir para uma decisão mais informada.
Sair na hora certa traz um sentimento de vitória. Isso não apenas abre espaço para novas lideranças e talentos que podem se beneficiar do apoio de quem sai, mas também assegura a continuidade e o crescimento do projeto ou negócio. Possibilita a continuidade de seu legado sob uma nova perspectiva.
Por outro lado, a falta de planejamento e a relutância em aceitar o fim de um ciclo podem ser desastrosas. Essas atitudes podem destruir projetos, dar espaço para adversários e retardar o desenvolvimento da equipe ou do negócio - assistimos frequentemente a casos semelhantes na presidência de empresas ou de conselhos de administração. Embora no ambiente corporativo esse prolongamento seja mais comum no caso de donos ou fundadores de empresas familiares, ele também ocorre com executivos de mercado e conselheiros independentes.
O tema da sucessão é frequentemente cercado de místicas e, muitas vezes, associado ao fim de uma vida. No entanto, sabemos que a continuidade é possível quando o processo é planejado e bem preparado. Fazendo um paralelo com o esporte, temos o exemplo do Pelé e, mais recentemente, do tenista Roger Federer, que se retirou das competições ainda com a aura de uma grande liderança, tendo planejado sua saída de maneira exemplar.
A habilidade de reconhecer e aceitar o momento de transição é essencial para o sucesso contínuo, seja no mundo corporativo, na política ou na vida pessoal. Para isso, autoconhecimento e humildade são cruciais. Encerraremos vários ciclos ao longo de nossa trajetória, e cada fim deve ser visto como uma oportunidade para um novo começo, mais forte, promissor e adequado ao momento atual.
Vicky Bloch é fundadora da Vicky Bloch Associados, professora do IBGC, da FIA e membro de conselhos de administração e consultivos