Arbitragem ou Justiça para as disputas complexas?

É hora de revisitar a (equivocada) premissa de que a arbitragem é sempre mais cara que o processo judicial

Por


Executivos jurídicos e comerciais frequentemente se deparam com o dilema sobre a inclusão ou não de cláusula de arbitragem em seus contratos. A dúvida central é se, financeiramente, vale submeter certas disputas à arbitragem, considerando que os custos desse procedimento podem ser significativamente maiores que os do processo judicial. Essa pergunta, porém, pode estar baseada em premissas inadequadas, merecendo ser revisitada.

Em primeiro lugar, é essencial indagar se a arbitragem é realmente mais cara que o processo judicial quando se leva em conta tanto o custo financeiro quanto o custo de oportunidade, analisando-os sob a ótica do tempo necessário para a resolução do litígio. Em outras palavras, quanto tempo a parte pode esperar pelo resultado da disputa e como essa espera impactará a gestão de seus recursos e projetos?

Os “custos acessórios” da arbitragem tendem a ser similares aos do processo judicial: honorários de peritos e de assistentes técnicos não variam significativamente em função da jurisdição a que uma disputa está sujeita. Portanto, o custo adicional da arbitragem está nas taxas de administração do procedimento e nos honorários dos árbitros, que podem superar com folga as custas judiciais.

Voltemos à questão do custo de oportunidade. Se é crucial para a parte que seu caso seja julgado com qualidade, rapidamente e de forma definitiva, essa urgência tem reflexos patrimoniais. O custo de oportunidade de, por exemplo, manter a construção de uma planta industrial paralisada enquanto o Judiciário leva anos para decidir se a empreiteira tem ou não que realizar determinado escopo da obra deve justificar o investimento em honorários de árbitros especializados e capazes de solucionar o conflito de maneira rápida, eficiente e tecnicamente adequada.

O custo financeiro em si também pode influenciar na decisão de adotar a arbitragem como método de resolução de disputas. Se considerada como um investimento na conclusão de um projeto, a arbitragem oferece um retorno incomparavelmente mais rápido dos recursos aplicados do que o litígio judicial. Isso significa que as partes obterão, em relativamente pouco tempo, a definição do conflito, permitindo-lhes a segurança de saber como alocar recursos daí em diante - ao invés de, durante anos de espera por uma solução judicial, provisionarem somas relevantes que poderiam estar gerando novas receitas.

Objetivamente, a arbitragem deve ser vista como parte da estratégia de negócios (dos custos de transação) das partes, sem perder de vista o impacto jurídico dessa escolha. A visão conjunta de executivos e advogados sobre o contrato e seus possíveis desdobramentos é decisiva para determinar se e como optar pela resolução privada do conflito futuro, inclusive para a redação da cláusula de arbitragem mais adequada para o contrato em concreto.

Os relatórios recentes divulgados pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e pelo Centro de Arbitragem e Mediação da Câmara de Comércio Brasil-Canadá (CAM-CCBC) - entidade que administra cerca de 40% das arbitragens no País (cf. dados de 2022) - fornecem uma visão detalhada do panorama da resolução de conflitos no Brasil e insights valiosos para aquelas decisões comerciais.

Em 2023, a Justiça Estadual e a Justiça Federal juntas receberam mais de 7,7 milhões de novas ações de conhecimento, enquanto mais de 20 milhões de processos permaneciam pendentes de julgamento. Na média geral, os processos estão pendentes há cerca de 4,5 anos (considerando os procedimentos de Juizados Especiais, muito mais rápidos que os da Justiça Comum). Por outro lado, a duração média das arbitragens no CAM-CCBC é de 1 ano e 9 meses (menos da metade do tempo), independentemente da complexidade.

A discrepância fica significativamente maior quando analisado o tempo de processamento em alguns dos principais tribunais do país: processos do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) levam, em média, 6,3 anos para serem julgados em última instância (i.e., incluindo recurso aos tribunais superiores); em Minas Gerais (TJMG), são 6,4 anos; no Tribunal de São Paulo (TJSP), a duração aumenta para 10 anos. Os Tribunais Regionais Federais das 1ª, 2ª e 3ª Regiões (então competentes pelos casos, p.ex., de Brasília, Rio de Janeiro e São Paulo) levam, respectivamente, 8, 5 e 7,5 anos para concluir suas causas.

São justamente os órgãos do Judiciário com competência sobre as partes que mais se socorreram a arbitragem perante o CAM-CCBC em 2023, cujo relatório revela que, das arbitragens instauradas no ano passado, 47% das partes têm sede em São Paulo, 9,94% no Rio de Janeiro, 4,76% em Minas Gerais.

Considerados tais dados, uma disputa submetida a arbitragem tende a durar menos de 20% do tempo que levaria para ser concluída se processada no TJSP; e menos 30% da duração de um processo no TJRJ ou no TJMG.

Portanto, é hora de revisitar a (equivocada) premissa de que a arbitragem é sempre mais cara que o processo judicial. Quando considerados os custos de oportunidade e a eficiência na resolução de disputas, a arbitragem pode ser a opção mais vantajosa. A decisão deve ser baseada em uma análise detalhada das necessidades e estratégias empresariais, considerando tanto os custos diretos quanto os impactos de longo prazo na gestão de projetos e recursos.

Marcelo Levitinas é sócio de Resolução de Disputas de Graça Couto Advogados

Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico. O jornal não se responsabiliza e nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso dessas informações

Mais recente Próxima Destaque

Agora o Valor Econômico está no WhatsApp!

Siga nosso canal e receba as notícias mais importantes do dia!