Você pode ter clicado neste link achando que o autor se enganou. Nesta quarta-feira (19), como todos acompanharam, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central decidiu interromper o ciclo de corte de juros que havia iniciado em agosto de 2023, quando a taxa básica Selic estava em 13,75% ao ano, e manteve essa taxa nos 10,50% onde ela chegou na reunião de maio.
Mas ora, se a taxa Selic foi mantida, e não reduzida, como queria o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, como afirmar que os juros caíram?
O gráfico abaixo esclarece a questão. Na véspera da decisão do Copom, os juros nominais de mercado para daqui a 12 meses (linha azul) estavam em 11,06%. Na tarde desta sexta-feira (21), enquanto escrevo este texto, a mesma taxa está em 10,41%. Uma queda de mais de meio ponto percentual em dois dias. Queda semelhante se observou no juro real projetado para 12 meses (linha amarela), de volta para a casa dos 6,50%. No fechamento, a queda ficou um pouco menor: o juro nominal em 10,86% e o real em 7%, mas ambos abaixo dos níveis observados na quarta-feira. (texto atualizado às 17h50 com dados de fechamento dos negócios)
Vale dizer, o Planalto talvez tivesse cantado vitória se a Selic tivesse diminuído mais 0,25 ponto percentual na quarta-feira, ou mesmo se alguns dos diretores do BC, indicados pelo atual governo, tivessem votado pela redução da taxa básica. Mas seria uma vitória de Pirro. Se a Selic tivesse caído, essa outra taxa de juros, o juro de mercado de 12 meses à frente, provavelmente teria subido. Seria como se o mercado estivesse dizendo: "Ok, vocês reduziram a taxa agora, mas vão precisar subir logo em seguida". E é essa segunda taxa e os juros reais da linha amarela do gráfico, e não a Selic de um dia, que realmente influenciam a tomada de decisão dos agentes econômicos.
Se alguém duvida que isso poderia ocorrer, basta olhar no gráfico o que aconteceu após a última redução da Selic, na noite de 8 de maio, quando ela caiu de 10,75% para 10,50% ao ano. Com o placar do Copom dividido, e especialmente pela forma como foi dividido, com os diretores indicados pela administração atual votando por um corte de 0,50 ponto percentual, o efeito sobre os juros futuros foi o inverso. A Selic caiu, como quiseram todos os integrantes do Copom naquele dia (com maior ou menor intensidade), mas os juros de mercado subiram nos dias que se seguiram após a reunião, pelo aumento da incerteza sobre a condução da política monetária a partir de 2025 (desfecho que nenhum dos diretores do BC queria naquele dia).
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Não que não houvesse razões técnicas que justificassem o voto pelo corte de 0,50 ponto percentual na reunião de maio. Se tivesse havido uma unamidade pela redução de 0,50 ponto naquela ocasião, como indicava o guidance, e um comunicado cauteloso sobre as decisões futuras, o mercado receberia bem essa escolha, e os juros futuros teriam se comportado. Mas a forma como a decisão foi tomada e divulgada reduziu a confiança dos agentes de mercado, e os juros subiram.
Como não dá para colocar o leite derramdo de volta no copo, esse cenário passou a exigir uma postura mais conservadora do que a seria estritamente necessária por parte do Copom, para que os investidores voltem a acreditar que o Banco Central segue com o compromisso de levar a inflação para a meta de 3% ao ano em 2025 e 2026.
A decisão unânime de quarta-feira, somada ao comunicado duro apresentado com ela, sinalizando que a Selic pode não cair ao menos até março para levar a inflação de 2025 para a meta, aparentemente ajudou a acalmar os ânimos (indicam os juros futuros), a despeito dos ataques de Lula ao Copom, e em especial ao presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto.
Lula precisa ter claro, porém, que o melhor que Gabriel Galípolo e os outros diretores indicados por ele poderiam fazer para reduzir "os juros" que realmente importam para as decisões de negócios nesta semana era votar pela manutenção da Selic. E assim eles fizeram.
Falta agora o Copom e o presidente do BC darem um passo a mais na melhora de comunicação com o mercado, e deixarem de apenas lamentar o que chamam de "desancoragem" das expectativas/projeções de inflação, como se não fosse também papel da autoridade monetária conduzir essas expectativas/projeções de inflação para um ou dois anos a frente, em vez de ser apenas observadora da situação e se mostrar assustada com o que vê.
Uma declaração como a de Mario Draghi, ex-presidente do Banco Central Europeu, na linha do "whatever it takes", mas neste caso sinalizando o compromisso com a meta de inflação, poderia ajudar. Com o BC deixando claro que quem apostar em outro cenário — no Focus ou no mercado de juros — vai errar na previsão.
Fernando Torres é editor-executivo do Valor
E-mail: [email protected]
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