Assine
celebridade

Por que nos importamos tanto com a Princesa Diana?

A estreia da 4ª temporada de “The Crown” levantou novamente as questões de perseguição da mídia e opressão na monarquia

audima
|
Julia Pitaluga
audima
Princesa Diana (Foto: Tim Graham Photo Library via Getty)

Mais uma vez voltamos ao assunto Princesa Diana. Como Jacqueline Kennedy Onassis ou Angela Diniz, Lady Di se tornou uma espécie de assunto em comum cultural para o qual voltamos, por motivos diferentes, mas voltamos para buscar novas respostas para nossas próprias angústias, escolhas e dúvidas do legado que Diana Frances Spencer deixou ao mundo.

CONTINUA DEPOIS DA PUBLICIDADE

Legado que realmente não é só sobre suas roupas e escolhas de moda que, é verdade, mesmo sem intenção inicial alguma, a tornaram um ícone de inspiração imortal. Também não é sobre sua beleza padrão ou exatidão materna como as manchetes dos tablóides insistiam de forma misógina em levantar naqueles tempos. Esse legado ao qual me refiro é ainda mais pessoal. É sobre como a história dela nos trouxe para o agora.
 

Princesa Diana (Foto: Tim Graham Photo Library via Getty)


Desta vez, a 4ª temporada de “The Crown”, mais conhecida nas redes sociais como a “Temporada da Diana”, desde o anúncio dos possíveis atores que interpretariam os herdeiros até as primeiras aparições de fotos vazadas de bastidores de gravações, detalhou na ficção momentos difíceis e delicados que Lady Di passara desde a sua aproximação com o Charles, Príncipe de Gales.

Apesar da ficção não nos deixar enganar pensando que são descrições precisas do que realmente aconteceu já que documentários como “The Story of Diana” (2017) e “Diana: In Her Own Words” (2017) contaram histórias parecidas antes mesmo do anúncio da nova temporada da serie ovacionada da Netflix, a pergunta que fica é a seguinte: por que realmente nos importamos tanto com a Princesa Diana?

Princesa Diana (Foto: Tim Graham Photo Library via Getty)

Em uma pequena pesquisa de materiais jornalísticos em meus acervos percebo que é realmente imprescindível que prestemos atenção como editores e autores homens brancos brasileiros, até hoje celebrados e protegidos por seus feitos literários, jornalísticos sobretudo publicitários, foram fundamentais para a construção e perpetuação do senso comum racista, machista e misógino que impera até hoje na mídia de modo geral - que é capitaneada, ainda hoje em 2020, por 68% de homens brancos em cargos de jornalismo de opinião, 28% de mulheres brancas e 2% de homens negros na mesma percentagem que mulheres negras, segundo levantamento de análise de composição racial e gênero de colunistas de três principais jornais brasileiros de maior circulação pela GEMAA, núcleo de pesquisa que desenvolve estudos sobre ação afirmativa e a representação de raça e gênero em instituições e mídias.

CONTINUA DEPOIS DA PUBLICIDADE

A conta parece não fechar em um país como o Brasil que 4.519 mulheres foram assassinadas em 2018, o que corresponde a uma mulher morta a cada duas horas sendo as mulheres negras 3.070 dessas vítimas, ou seja, 68% do total, conforme aponta o Atlas da Violência 2020 produzido pelo Ipea e pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), divulgado em agosto deste ano. Ainda em dados, inéditos, que fazem parte de um levantamento feito pelo site do G1, mulheres negras são as principais vítimas de homicídios no Brasil; já as brancas compõem quase metade dos casos de lesão corporal e estupro.

Princesa Diana (Foto: Tim Graham Photo Library via Getty)




Constantemente perseguida por paparazzis desde o início da década de 1980 quando se tornou conhecida ao grande público e com quase duas décadas captadas à exaustão quando o Palácio de Buckingham anunciou o seu noivado com o Príncipe Carlos, Lady Di foi uma das primeiras vítimas da era das lentes em modo zoom de fotógrafos de celebridades. 

Princesa Diana (Foto: Tim Graham Photo Library via Getty)



Especificamente, no caso da Princesa Diana sabemos que existem inúmeros fatores expostos que ocasionaram a tragédia final no túnel da Ponte de l’Alma, em Paris, na França em 31 de agosto de 1997. Mas não há como negar o papel que a monarquia, sistema colonial e altamente opressor e que a própria princesa fazia parte e perpetuava, desempenhou reforçando a misoginia em quase duas décadas de Diana como Princesa de Gales e também o papel que a mídia sensacionalista e o conhecido jornalismo de celebridades tiveram para o adoecimento da Diana ainda em vida.

CONTINUA DEPOIS DA PUBLICIDADE

Se o interesse de Diana por parte da imprensa começou cedo, logo antes do anúncio do noivado e, mais tarde, a partir do casamento, em 29 de julho de 1981, ele foi crescendo na inversa proporção da felicidade pessoal e matrimonial. Essa infelicidade é demonstrada como negligenciada por todas as partes em materiais audiovisuais documentais e também ficcionais sobre a princesa, sobretudo negligenciada pelos tablóides e paparazzis.

Princesa Diana (Foto: Getty Images)


A questão é: qual o limite da interação do jornalismo de celebridades na vida pessoal de uma figura pública? Há limites? E como seria viver em um mundo que não odiasse as mulheres? Quem eu seria se vivesse em um mundo que não odiasse as mulheres? Quem teriam sido Diana Frances Spencer, Angela Diniz, Gabrielle Dayer, Marielle Franco, Daniella Perez, Amy Winehouse, Sharon Tate, Marsha P. Johnson, Jean Seberg, Breonna Taylor (e tantas, tantas outras) se tivessem vivido em um mundo que não odiasse as mulheres e tivessem tido mais tempo para ser quem elas queriam ser?

Talvez por sentimentos de identificação, principalmente entre as mulheres em suas diversidades e diferentes lugares de opressão possam ter sobre a imagem de Lady Di - o legado da Princesa Diana e sua história de adoecimento mental sendo um ser humano em meio à perversidade que o sistema operacional e colonial da monarquia que ela já fazia um pouco parte mas a incluiu ainda mais, traições do Príncipe Charles com Camilla Parker, instabilidades emocionais e a perseguição de uma mídia perversa e capitalista se torne cada vez mais vivo e importante de ser falado. E é por causa desse vasto legado de sentimentos contrapostos que Diana causa que podemos debater hoje abertamente sobre consciência de gênero, raça e classe, ainda mais em uma perspectiva de monarquia que terminou em um desastre.

CONTINUA DEPOIS DA PUBLICIDADE
Princesa Diana (Foto: Getty Images)

Em um recorte do que a misoginia da imprensa brasileira fazia com a Lady Di com pesquisa de materiais retirados da Revista Manchete de 1981 a 1997 com um dos textos da sequência traduzido da Revista TIME em algumas frases a seguir:
 

Princesa Diana (Foto: Reprodução)

“...e, principalmente, virgem”

“...a foto com o vestido transparente foi avidamente valorizada pela imprensa (...)”

“(...) os fotógrafos se serviram à vontade (...)”

“Um abalo no seio da Casa Real”

“Os ingleses estão excitadíssimos (...)”

“Depois da queda do decote (...)”

“...volta a escandalizar com os decotes. Pois, afinal, é uma lady”

“Passada a mágoa da separação, uma mulher de olhos e pele brilhantes, vaidosa e saudável (...)”

“...brilhava com o decote generoso, revelando ombros perfeitos (...)”

Leia mais