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Bar Jacket da Dior: uma breve história da icônica peça que celebra 73 anos
A Bar Jacket foi apresentada no primeiro desfile da grife francesa, em 12 de fevereiro de 1947
4 min de leituraA célebre Bar Jacket, da Dior, está comemorando 73 anos. Com seu formato de ampulheta, Christian Dior ofereceu às mulheres munição para afirmarem seus poderes de sedução, e trouxe à sombria era do pós-guerra um novo joie de vivre. A Bar Jacket desencadeou uma revolução na moda, comparada no século 20 apenas com o lançamento da minissaia por Mary Quant. Mas o New Look da Dior não foi apenas um momento para os livros de história; trata-se de um legado duradouro, uma referência de estilo a ser reconhecida por todos os diretores criativos que seguiram o fundador da maison na Dior – e muito além.
12 de fevereiro de 1947 foi um dia congelante em Paris, em um dos piores invernos que a cidade já enfrentara desde 1870 – o aquecimento global ainda não havia chegado. A oferta de carvão era escassa, os jornais estavam em greve por período indefinido, e a lembrança da falta de produtos devido à guerra ainda estava viva e dolorosa, mas os salões cor de cinza-concreto no número 30 da Avenue Montaigne estavam fervendo de ansiedade. Na plateia, Rita Hayworth estava sentada em uma banqueta perto de Begum Aga Khan, toda vestida de mink – protestos contra o uso de pele ainda não aconteciam. As notas da imprensa sobre a coleção destacavam duas silhuetas principais: “Corolle” (saia ampla rodada, cintura minúscula, corpete moldado) e “Eight” (limpa e curvilínea, linha do quadril e cintura acentuados). Bettina Ballard, da Vogue, relembrou o momento em seu memoir: “A primeira garota apareceu, caminhando rapidamente, balançando e fazendo um movimento provocativo, derrubando cinzeiros pelo caminho [também ainda não era proibido fumar em lugares fechados] e fazendo todos se sentarem eretos em seu lugar. Depois que mais alguns figurinos haviam passado, todos com a mesma dinâmica animada, a plateia sabia que Dior havia criado um New Look. Testemunhamos uma revolução na moda”.
O terno Bar era uma maravilha arquitetônica, feita com 4 metros de seda shantung em tom marfim suave, acolchoado na linha dos quadris para um formato mais feminino e arredondado. Reza a lenda que Pierre Cardin, que era na época o assistente de 21 anos de Monsieur Dior, teve de sair do ateliê para comprar enchimentos de algodão e lã para fazer a silhueta delgada da modelo Tania parecer mais voluptuosa. A saia de pregas preta Corolle – volumosa em uma época em que o consumo de tecido era ainda restrito – criou seu próprio drama. O New Look chegou à cena internacional com estrépito espetacular.
Aparentemente, a Bar Jacket emprestou seu nome do bar no Plaza Athénée, que Monsieur Dior frequentava. Foi um sucesso tão grande de vendas que foi amplamente copiada e replicada. O próprio M. Dior constantemente retrabalhava e atualizava sua pièce de résistance; ela foi apresentada em várias versões em quase todas as 22 coleções de alta-costura que ele desenhou, até sua repentina morte em 1957.
Após a morte de Christian Dior, a dança das cadeiras de sua substituição começou. De 1958 a 1960, o jovem, tímido e “imensamente talentoso” (nas palavras do próprio M. Dior) Yves Saint Laurent chacoalhou os códigos estabelecidos da maison com sua visão bastante radical do chic francês da alta sociedade. Ele alongou e quase dissolveu a bem formada Bar Jacket em uma nova silhueta que chamou de “linha Trapeze”, se distanciando da ditadura da elegância burguesa. Sua interpretação, quebrando as regras, mostrou-se provocativa e polêmica. Ele foi sucedido em 1961 pelo discreto e retraído britânico Marc Bohan, que permaneceu à frente da Maison Dior durante 28 anos, até 1989. Bohan suavizou linhas e volumes, trabalhando uma silhueta feminina e elegante apreciada por mulheres como a Princesa Grace de Mônaco e Sophia Loren. Sua primeira coleção para a primavera de 1961 teve o incrível nome de “Slim Look”, refletindo o estilo jovem e linear da época. Suas interpretações do terno Bar podiam ser graciosas, esbeltas e refinadas, ou um tanto reverentes, como a versão que ele repdroduziu em homenagem à original apresentada em 1987.
Em 1989 foi a vez de Gianfranco Ferré; o estilista italiano trouxe uma extravagância arquitetônica à Maison, com uma queda por floreios históricos e grandiosidade. Sua versão da Bar Jacket tinha toda a exuberância rica e voluptuosa de seu estilo.
Com a saída de Ferré em 1996, o talento visionário e as habilidades completas de produtor artístico de John Galliano transformaram os desfiles da Dior em experiências teatrais sensacionais; as coleções eram dramáticas e espetaculares. A versão de Galliano do terno Bar foi hiperbólica com toda sua extravagância.
O estilo modernista e escultural de Raf Simons foi o antídoto para os excessos de Galliano. Ele se tornou diretor criativo em 2012, e sua primeira coleção de alta-costura foi de uma pureza impactante. Simons homenageou o amor de Monsieur Dior pela arquitetura, mas o fez à sua maneira, deslocando e mudando os elementos simbólicos da Bar Jacket em outras peças, em um elegante gesto ao mesmo tempo respeitoso e provocativo.
Em 2015, Maria Grazia Chiuri se tornou a primeira mulher à frente da maison. Sua visão é conceitual e artística, adotando um ponto de vista feminista por meio de colaborações com artistas e intelectuais; ao mesmo tempo, sua prática é ancorada na elegante feminilidade que Monsieur Dior apreciava. Suas silhuetas modernas são inteligentemente woman-friendly. Não foi surpresa que Chiuri tenha celebrado a Bar Jacket em quase todas as suas coleções: sua forma hiperfeminina claramente agrada seu senso clássico de beleza – sedutor porém autoritário.
As colaborações com artistas e colegas estilistas são características que estão definindo o mandato de Chiuri na Dior. Para sua coleção resort 2020, ela convocou a artista plástica afro-americana Mickalene Thomas e a designer britânica Grace Wales Bonner para reinventarem a Bar Jacket; elas revigoraram a cultuada peça com interpretações fortes e cheias de imaginação.