O ano de 2023 será lembrado pelo clima mais extremo já observado no Brasil. O pior em calor, com nove ondas registradas, sendo as da primavera capazes de afetar quase todo o país. No Rio, a sensação térmica chegou a 60°C. E também houve seca histórica na Amazônia, a mais severa na Bacia do Rio Negro, onde fica, por exemplo, Manaus (AM). Cientistas observam que há uma escalada de eventos extremos desde 2020 e tudo indica que 2024 seguirá pelo mesmo caminho de ondas de calor, supertempestades, inundações e secas.
![Brigadistas do ICMBIO combatem incêndio florestal que atingiu o Pantanal, em novembro — Foto: Arte O GLOBO/Agência Brasil](https://s2-oglobo.glbimg.com/7HxoCzfXbSWBvhluoawazhc2_HM=/0x0:1100x715/984x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2023/w/X/wjTLNWQGCUvXhLLQZEaQ/pantanal2.jpg)
Para o coordenador-geral de Operações do Centro Nacional de Monitoramento de Desastres Naturais (Cemaden), Marcelo Seluchi, só não se pode dizer que foi o ano mais extremo em chuvas porque 2022 também foi devastador, com tragédias em Petrópolis (RJ), Angra dos Reis (RJ) e Paraty (RJ), e Recife (PE). Ainda assim, 2023 teve a maior chuva de todos os tempos.
— Desde 2020 tivemos La Niña, El Niño, períodos neutros e o padrão se manteve. É realmente o aquecimento global. Os oceanos estão mais quentes e já não conseguem absorver mais tanto o calor derivado da ação humana. Absorveram o quanto puderam e agora captam cada vez menos. Esse calor evapora. Oceanos são uma fonte de calor muito grande e isso torna, por exemplo, as tempestades mais intensas — afirma Seluchi.
O país foi castigado o ano todo, de Norte a Sul. Mais de 100 municípios do Rio Grande do Sul sofreram com enchentes, em setembro. O Pantanal ardeu em chamas, comunidades ficaram isoladas com a baixa dos rios na Floresta Amazônica. Exemplos de extremos em um ano marcado pela fúria do clima.
![Em fevereiro, fortes tempestades atingiram a cidade de São Sebastião, em São Paulo, causando deslizamentos — Foto: Arte O GLOBO/Maria Isabel Oliveira](https://s2-oglobo.glbimg.com/OnQDcT1EIzkPfuXhXj4yLdW-Ar8=/0x0:1100x715/984x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2023/S/Z/XtzrwoRmqHkmLhtaDTbQ/maior-chuva-do-brasil.jpg)
A maior chuva do Brasil
Um temporal devastou o Litoral Norte de São Paulo em fevereiro, matando 65 pessoas. São Sebastião foi a cidade mais arrasada, mas as águas castigaram ainda Bertioga, Ilhabela, Ubatuba, Caraguatatuba, Santos, Praia Grande e São Vicente. Temporais causaram deslizamentos, bairros ilhados, com problemas de abastecimento de energia, água e telefonia. Rodovias ficaram com trechos interditados.
Somente em Bertioga, das 12h de 18 de fevereiro às 12h do dia seguinte, choveu 715 mm. Esse é o maior registro de chuva em um período de 24 horas da História do Brasil, segundo o Cemaden, que é ligado ao Ministério de Ciência e Tecnologia. O evento nada tem a ver com o El Niño, que sequer havia se formado.
![Em Porto Alegre, as tempestades subiram o nível do Guaíba para o maior visto desde 1941 — Foto: Arte O GLOBO/Silvio Avila - AFP](https://s2-oglobo.glbimg.com/VqeA6SJQDS6CJn_ohlCxGy8rfCw=/0x0:1100x715/984x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2023/X/g/1AbNNdRrmZHv1MjjR6LA/diluvio-no-sul.jpg)
Dilúvio no Sul
As chuvas no Sul começaram cedo e seguem intensas, sem previsão de melhora significativa no verão de 2024. A enchente mais devastadora atingiu a região da Bacia dos rios Taquari e das Antas, que abrange mais de 100 municípios do Rio Grande do Sul, em setembro. Foi a segunda maior cheia, menor apenas que a de 1941. Porto Alegre (RS) teve ruas alagadas na maior cheia do Rio Guaíba desde 1941.
![Temporal provocou alagamentos e deixaram milhares de pessoas fora de casa em Santa Catarina — Foto: Arte O GLOBO/ Divulgação](https://s2-oglobo.glbimg.com/7mV2sg4xJ6YcA4lK-ROj18qTud8=/0x0:1100x715/984x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2023/B/j/jZBrtpSLWCXNREK0UKvw/tsunami-meteorologico.jpg)
Tsunami meteorológico
Em 11 de novembro, Laguna (SC) registrou um fenômeno chamado de tsunami meteorológico. Quatro ondas de longa duração (entre 14 e 16 minutos, período medido entre se formar e quebrar, acumulando mais água e potência) causaram pânico e destruição na Praia do Cardoso. O fenômeno, cujo nome mais adequado é trem de ondas, ocorreu ainda outras vezes este ano: em abril, na Praia da Joaquina, também em Santa Catarina; e em novembro em Niterói (RJ). O fenômeno é gerado pela pista de vento de uma grande tempestade no mar.
![Em Porto Alegre, a Orla do Guaíba inundada. — Foto: Arte O GLOBO/Divulgação](https://s2-oglobo.glbimg.com/WkPy8aj_4fgXFjB7O-HE5q2S7Do=/0x0:1100x715/984x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2023/1/1/BKaLYvTYeRwJEVfWujsA/primavera.jpg)
Primavera de tempestades
Os meses de setembro, outubro e novembro tiveram 5.213 tempestades classificadas como severas, com ventos acima de 100 km/h, granizo acima de 4 cm de diâmetro e, por vezes, tornados. Esse número representa um aumento de 160% em relação à média para o período (desde 2018).
O ano deve fechar com cerca de 10 mil supertempestades, quatro mil a mais do que os outros anos, segundo a Plataforma de Registros e Rede Voluntária de Observadores de Tempestades Severas (Prevots). O Sul foi a região mais afetada, mas o Sudeste e parte do Centro-Oeste também registraram muitas tormentas.
![O barco encalhado em banco de areia no Rio Negro devido a seca. — Foto: Arte O GLOBO/Agência O GLOBO](https://s2-oglobo.glbimg.com/S5Vihal6nDQTe1ZZnDOacFHciH4=/0x0:1100x715/984x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2023/q/h/kfFPgWQLyCrX5mRhuFaw/seca-norte.jpg)
Seca na Amazônia
Em ano de combinação do El Niño com elevação sem precedentes da temperatura do Atlântico Norte (2°C acima da média), a Amazônia teve seu padrão de chuvas alterado, culminando com a maior seca da História da Bacia do Rio Negro, que chegou ao seu menor nível: 13,49m, em 17 de outubro, em Manaus.
A seca severa fez o nível dos principais rios do Sul do Amazonas ficar abaixo da média e comunidades ficaram sem água e isoladas. O Amazonas, além de Solimões, Madeira, Juruá e Purus foram atingidos. Em dezembro, chuvas têm melhorado a situação, mas a persistência de condições excepcionais pode fazer a seca perdurar no primeiro semestre de 2024.
![No Rio, as pessoas se protegem do sol em um ponto de ônibus na Avenida Brasil durante a alta temperatura no inverno — Foto: Arte O GLOBO/Marcia Foletto](https://s2-oglobo.glbimg.com/zZuVlLhu5EmlMtW04D47-fGyE14=/0x0:1100x715/984x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2023/2/c/BSDIuMQzaUsKHRoj9rBw/ondad-e-calor.jpg)
Ondas de calor
Inexistem bancos de dados oficiais de ondas de calor no Brasil, mas 2023 registrou nove desses eventos e é considerado o pior ano. Um estudo revelou que em 30 anos o Brasil passou de 7 para 52 o número de ondas de calor por ano. As mais intensas ocorreram na primavera e atingiram quase todo o Brasil. Capitais como Rio de Janeiro e Cuiabá (MT) quebraram recordes. O Rio alcançou a sensação térmica de 60°C.
A pior dessas ondas durou de 8 a 19 de novembro e igualou o recorde de maior temperatura do Brasil. No dia 19, Araçuaí (MG) marcou 44,8°C, a mesma registrada em Nova Maringá (MT) em 5/11/2020. A previsão é de mais calor no verão, sobretudo, no Sudeste e no Centro-Oeste.
![Árvores sendo consumidas pelo incêndio florestal que atingiu o Pantanal — Foto: Arte O GLOBO/Agência Brasil](https://s2-oglobo.glbimg.com/We_A3EjCPEcpVun9K80srHfxZlE=/0x0:1100x715/984x0/smart/filters:strip_icc()/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2023/3/H/C5UuZSTmiCsVR1kVt88g/pantanal.jpg)
Incêndios no Pantanal
O Pantanal teve uma primavera de fogo. Pela primeira vez, o bioma queimou com grande intensidade em novembro, quando a estação chuvosa costuma começar. Os incêndios se inciaram no fim do mês anterior e se alastraram pela combinação do tempo seco e ventos fortes. Bombeiros, brigadistas e voluntários se embrenharam nas matas para apagar o fogo.
Mais de um milhão de hectares foram destruídos em 2023 no Mato Grosso e no Mato Grosso do Sul, um número três vezes maior do que o de 2022, de acordo com o Laboratório de Aplicações de Satélites Ambientais, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).