Brasil
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Por Ricardo Pinheiro — Rio de Janeiro

Renda, apoio social, saúde, senso de liberdade, generosidade e percepção da corrupção. Esses são os seis pontos avaliados pela ONU para medir o nível de felicidade dos países ao redor do mundo. O Relatório Global da Felicidade, feito anualmente há mais de uma década, revelou nesta semana um resultado aparentemente ruim para o Brasil, que, do último levantamento para este, caiu da 38ª posição para a 49ª. Mas só aparentemente. É o que explica ao GLOBO o psicanalista Lucas Liedke. Para ele, ruim mesmo seria se “seguíssemos felizes” em meio à pandemia e à polarização política que vivemos nos últimos anos.

— Com a realidade que estamos vivendo, que bom que caímos [no ranking da felicidade] (risos). Sinal de que estamos cientes do que está acontecendo. Tudo bem que estamos na 49ª posição. Quem sabe no ano que vem ela pode ser outra. Até lá, temos tempo para mudá-la. Essa é outra forma de olhar para esse número sem nos sentirmos derrotados, mas com alívio. Vamos aceitar. Foi difícil, mas vamos em frente — afirma o psicanalista, que se diz “um pouco preocupado” com comparações e rankings.

— Talvez essa percepção de mudança do nosso próprio país seja mais interessante do que avaliar quais países estão melhores ou piores que a gente — diz.

'Não há carnaval ou partida de futebol que dê conta'

Para Liedke, há uma confusão entre felicidade e alegria (ou prazer). Ele pontua que traçar essas diferenças pode nos ajudar a entender com mais clareza o Brasil estar menos feliz.

— À princípio, pode parecer surpreendente que o Brasil esteja mal nesse ranking porque, em teoria, a imagem que temos de nós mesmos e colocamos para o mundo é a de que o Brasil é um povo muito alegre e com uma cultura orientada pelo prazer. Os países nórdicos [muitos deles no topo da lista] têm um jeito mais frio e mais organizado, não é essa alegria fervorosa do Brasil. Isso chama a atenção. No entanto, eu pensaria na felicidade mais como a capacidade de conseguirmos navegar por uma ampla variedade de emoções. Não é sobre estar alegre o tempo todo. Isso é estado maníaco — diz o psicanalista.

E, quando a realidade material do Brasil encontra com a subjetividade dos brasileiros, acabamos "normalizando absurdos" e, para isso, “não há carnaval ou partida de futebol que dê conta”, brinca Liedke.

— É preciso ter segurança, dinheiro, saúde e uma série de coisas mais palpáveis para chegar no estado de felicidade, e não só esses ápices ligados ao prazer — diz.

— Talvez essa parte mais intangível e emocional da nossa cultura já não esteja dando tanta conta do nosso buraco. Estamos tentando sair dele, com todos os conflitos ideológicos que ele tem. Aconteceram verdadeiros colapsos nas famílias por incapacidade de diálogo e reflexão — conclui o psicanalista.

Saúde mental não pode ser sinônimo de 'positivação' da vida

Nos últimos anos, em razão da pandemia de Covid-19, a questão da saúde mental — um dos pontos avaliados na medição da felicidade —foi para o centro dos holofotes. Com as restrições e inseguranças às quais fomos obrigados a nos acostumar, acabamos ficando mais sozinhos e, consequentemente, acabamos dando uma atenção maior para nós mesmos e nossos conflitos internos. Agora, passados os tempos mais difíceis da pandemia, e sob o comando do novo governo federal, que tomou posse no dia 1º de janeiro deste ano, o Brasil passa a ter um inédito Departamento de Saúde Mental dentro do Ministério da Saúde.

O caminho daqui para a frente, no entanto, é longo, como enxerga o psicanalista, e não pode ser o de transformar a saúde mental em hiperpositividade.

— Saúde mental não é sobre hiperpositividade. Tem uma lógica de produtividade que predomina o neoliberalismo: ‘O meu funcionário precisa estar bem para continuar trabalhando e, por isso, vou cuidar da saúde mental dele. Isso é muito opressor e me preocupa. A saúde mental não pode estar atrelada a promessas de felicidade e sucesso, dentro dessa estratégia de ‘positivação’ da vida. Isso só gera uma sensação maior de fracasso, porque você não vai dar conta de tudo — afirma Liedke.

Para ele, abraçar a tristeza, diferente do que se pensa dentro dessa lógica, é bom.

— Quais são os espaços e os tempos que temos para viver a tristeza e o luto? Existe essa dificuldade de vermos a tristeza representada na cultura de massa e, quando não temos contato, ela acaba sendo enxergada como depressão. Quando lidamos melhor com a tristeza ficamos menos deprimidos. Não devemos patologizar os momentos de contemplação, silêncio e introspecção. Quando vem a tristeza, a desgraça ou a tragédia, temos que elaborá-las o tempo que for preciso para atravessá-las — diz o psicanalista. E conclui:

— Precisamos criar espaços para as pessoas poderem falar sobre as suas dores (seja pelas empresas ou pelos governantes) e investigar seus traumas, faltas e medos. Esse senso de coletivo é importante e tem a ver com cuidado e escuta. É um processo mesmo. É complexo. Vai levar tempo.

Afinal, como diz o refrão, “Tristeza não tem fim/ Felicidade sim”.

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