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Por O Globo e agências internacionais — Cidade do Vaticano, Vaticano

O Papa Francisco desembarcará na terça-feira para uma visita de seis dias à República Democrática do Congo e ao Sudão do Sul, em um apelo por trégua em duas nações marcadas por décadas de exploração, pobreza e conflitos. A "peregrinação da paz" será a 40ª viagem ao exterior de seu pontificado, mas a primeira sem que haja outro Papa no perímetro do Vaticano, após a morte do emérito Bento XVI no último dia de 2022.

Não é à toa que Francisco, cujo Papado completa dez anos em março, fará sua quinta visita à África: o continente é lar de 20% dos 1,3 bilhão de fiéis da Igreja e o continente onde o catolicismo mais cresce — e se reinventa — no planeta. Entre 2019 e 2020, a religião aumentou 2,1% em solo africano, e os jovens representam parte significativa dessa fatia.

O argentino ficará até 3 de fevereiro na RDC, país com o maior número de católicos da África: estima-se que 40% dos cerca de 100 milhões de habitantes sejam fiéis. O Leste do país, em particular, é palco de confrontos ferrenhos pelo controle de minérios. Entre eles o coltan, resultado da união da columbita e do tântalo, e essencial para que a Humanidade tenha iPhones, videogames e computadores.

Estima-se que 75% das reservas de coltan estejam lá, mas há também ouro, diamantes e urânio. Pouquíssimas das minas são geridas pelo Estado, e aos 120 grupos paramilitares da região somam-se os interesses de nações vizinhas como Uganda e Ruanda. Entre junho de 2021 e março de 2022, mais de 1,2 mil civis morreram por lá, e os atritos não cessam.

A viagem de Francisco à África deveria ter acontecido em julho do ano passado, mas foi adiada devido aos problemas no joelho que fazem o Papa precisar de bengala e cadeira de rodas para se locomover. O plano inicial era que ele fizesse uma parada no Leste, na cidade de Goma, onde um embaixador italiano foi morto em 2021, mas a ressurgência dos embates entre o Exército e o grupo armado M23 suspendeu os planos.

Em uma entrevista ao jornal de língua espanhola Mundo Negro, publicado por missionários, o Papa condenou o que disse ser uma "inconsciência coletiva de que a África deve ser explorada", e disse que a mudança de itinerário não se deve ao medo:

— Não é que eu não vou porque estou com medo. Nada vai acontecer comigo, mas com uma atmosfera dessas, e vendo o que estão fazendo, podem jogar uma bomba em um estádio e matar muitas pessoas (...) Devemos tomar conta do nosso povo.

A RDC tornou-se independente da Bélgica em 1960, mas últimas décadas foram marcadas por conflitos. O primeiro depôs o ditador Mobutu Sese Seko, que governou de 1965 a 1997. O segundo eclodiu no ano seguinte e duraria até 2003, envolvendo nove países e mais de 20 grupos armados. O saldo foi a quase implosão do país e 5,4 milhões de mortes, principalmente por doenças e malnutrição.

Abaixo da linha da pobreza

Hoje, dois terços dos 95 milhões de congoleses vivem com menos de US$ 2,15 por dia, quantia que o Banco Mundial traça como a linha da pobreza. O Programa Mundial de Alimentos da ONU estima que 26 milhões de pessoas enfrentem fome severa.

A Igreja exerce um papel central para suprir parte do vácuo deixado pelo Estado: O Vaticano gerencia cerca de 40% dos centros de saúde e hospitais do país, independente da Bélgica desde 1960. Aproximadamente 6 milhões de crianças estudam em escolas católicas.

Mobutu estabeleceu uma Constituição secular em 1974, mas o Vaticano continuou a ocupar um papel importante na vida política do país. As intervenções para chegar a consensos em momentos de crise não foram poucas, e a relação com o atual governo também não é sem atritos: foi, por exemplo, um dos que questionaram a lisura das disputadas eleições de 2018, que levaram Felix Tshisekedi ao poder.

Há um novo pleito previsto para dezembro deste ano, e o bispo Donatien Nshole, secretário-geral da Conferência Nacional dos Bispos da RDC, recentemente disse que um apelo de Francisco para eleições justas seria bem-vindo. O Vaticano planeja também enviar observadores.

O Papa ficará em Kinshasa, onde vai desembarcar na terça e se encontrar com o presidente Felix Tshisekedi, representantes diplomáticos e da sociedade civil. Ele fará 12 discursos durante sua estada, mas o ponto alto será na quarta, quando se encontrará com vítimas do confronto no Leste e celebrará uma missa no aeroporto de Ndolo — estima-se que mais de 1 milhão de pessoas compareçam, um dos maiores públicos do Pontificado de Francisco, algo que levou o governo a reforçar a segurança.

Escala no Sudão

De sexta a segunda, o Papa estará no Sudão do Sul, independente desde 2011, onde estará acompanhado do arcebispo de Canterbury, Justin Welby, o chefe da Igreja Anglicana, e Iain Greenshields, responsável pela Igreja da Escócia. Os três impulsionam há anos o processo de paz para pôr fim à guerra civil que toma o país desde dezembro de 2013, quando forças leais ao presidente Salva Kiir entraram em confronto com os aliados do vice-presidente Riek Machar, com suas diferenças étnicas e pessoais.

Um acordo em 2018 pausou o pior do conflito, mas os embates entre as múltiplas facções nunca cessaram por completo e vários pontos do pacto permanecem pendentes. Metade da população do país de 11 milhões de habitantes lida com a fome extrema e precisa de ajuda urgente, afirma o Banco Mundial.

A Igreja participa ativamente das negociações na jovem nação, onde 52% da população se consideram católicos. Em 2019, quando já haviam morrido 200 mil pessoas, o Papa convocou ao Vaticano Kiir e Machar para um retiro espiritual. Na ocasião, virou manchete internacional ao ajoelhar-se a seus pés suplicando pela paz.

É a primeira vez que um Papa vai ao Sudão do Sul, e a viagem de Francisco será a primeira à RDC desde João Paulo II em 1985, quando a nação ainda era conhecida pelo nome Zaire. Ao todo, será a quinta ida do Pontífice argentino à África, missão que coincide com um momento-chave para o seu Papado.

Desde 2021, está em curso um inédito processo popular de consulta mundial para entender como é a Igreja do século XXI e quais rumos uma das instituições mais antigas do planeta deve seguir. O processo poderá desencadear mudanças significativas nas práticas eclesiásticas, e é visto como a tentativa de reforma mais ambiciosa da instituição em décadas.

Frente à relevância da África para uma instituição que perde cada vez mais fiéis na Europa e na América Latina, regiões onde sempre foi forte, as particularidades da prática da fé no continente podem ser determinantes. A necessidade de uma Igreja menos branca e eurocêntrica também culminou no ano passado na nomeação de 21 novos cardeais, em mais uma etapa da reforma que Francisco, tachado de muito progressista por seus críticos, tenta fazer na Santa Sé.

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