O presidente da França, Emmanuel Macron, se reuniu nesta segunda-feira com os ex-presidentes François Hollande (2012–2017), do Partido Socialista, e Nicolas Sarkozy (2007-2012), dos Republicanos, para discutir a nomeação do novo primeiro-ministro. O ex-premier Bernard Cazeneuve (2016-2017) e o premier interino, Gabriel Attal, também foram consultados durante a nova rodada de conversas no Palácio do Eliseu, que já dura duas semanas. No entanto, as indefinições sobre quem será indicado e quando uma decisão será tomada permanecem, e mais personagens surgem na lista de cotados.
O país vive um impasse político desde as eleições legislativas de julho, que consagraram a vitória da coalizão de esquerda Nova Frente Popular (NFP), mas sem a maioria absoluta no Parlamento, hoje fragmentado em três grandes blocos. Na época, o centro macronista, que terminou com a segunda maior bancada, articulou um "cordão sanitário" para barrar um eventual governo do Reagrupamento Nacional (RN), sigla da extrema-direita liderada por Marine Le Pen que aparecia em primeiro nas pesquisas, mas que acabou como a terceira maior força na Casa.
A esquerda — que reúne socialistas, comunistas, verdes e a França Insubmissa (LFI, em francês), partido da esquerda radical que conquistou a maior bancada dentro do bloco — indicou o nome de Lucie Castets, diretora de finanças de Paris e membro dos socialistas, considerados uma ala mais moderada na coalizão. Mas Macron vetou Castets, alegando a necessidade de um quadro com ampla adesão entre as diferentes forças do Parlamento.
Diferentemente de outros países, na França o primeiro-ministro não precisa da maioria dos votos para se manter no cargo após a nomeação pelo presidente, apenas não pode ser alvo de uma moção de censura, ou seja, ser rejeitado pela maior parte dos parlamentares. Este é um dos principais motivos para os dois meses de impasse na política francesa, já que tanto a extrema-direita e parte da direita tradicional já sinalizou que censuraria um premier da esquerda quanto a esquerda se nega a abrir mão do controle da Casa, uma vez que detém a maior bancada.
Macron tem sugerido em diversas declarações que "ninguém ganhou as eleições", articulando nos bastidores a viabilidade de um governo "sem extremos", isto é, sem a esquerda radical e a extrema-direita. No sábado, deputados da França Insubmissa enviaram ao Parlamento uma proposta de impeachment de Macron pela recusa na indicação de Castets — um processo longo que demandaria a aprovação de dois terços da Casa e que sofre relutância dentro da própria esquerda.
“Tanto a Assembleia quanto o Senado podem e devem defender a democracia contra a tentação autoritária do Presidente da República, que não sabemos onde pararia”, instou o partido no texto.
Diante da incerteza quanto à indicação de Castets, novos personagens surgiram. Um deles é o ex-primeiro-ministro socialista Bernard Cazeneuve, que se reuniu com Macron nesta segunda e cujo nome foi amplamente mencionado no fim de semana. Sua indicação, porém, é alvo de resistência entre seus próprios correligionários. O primeiro-secretário do Partido Socialista, Olivier Faure, indicou que censuraria a proposta:
— Censuraremos qualquer forma de continuidade do macronismo — advertiu, sem citar explicitamente um eventual governo de Cazeneuve. — Não tenho nenhum problema pessoal com Bernard Cazeneuve. Que garantias existem para Bernard Cazeneuve, se não a de ser prisioneiro de (...) uma coalizão de Emmanuel Macron (...), mesmo que ele não tenha obtido e nem mesmo buscado o apoio da Frente Popular?
A líder da bancada da LFI, Mathilde Panot, foi ainda mais explícita durante uma entrevista nesta segunda-feira:
— Censuraremos qualquer governo que não seja liderado por Lucie Castets — disse. — Cazeneuve se opõe ao programa da Nova Frente Popular. Cazeneuve pertence ao velho mundo de [François] Hollande, do qual queremos virar a página.
Do lado da direita, o ex-presidente Sazorky defendeu publicamente durante o fim de semana a ascensão de Xavier Bertrand, presidente regional d'Os Republicanos (LR, em francês) — que durante as eleições se fragmentou, com uma parte se aliando à extrema-direita em determinados distritos. Ele foi ministro do Trabalho, das Relações Sociais e da Solidaridade entre 2007 e 2009, e não escondeu o interesse pelo cargo.
— A ideia geral é ver se as hipóteses de Cazeneuve e Bertrand são viáveis do ponto de vista do critério de estabilidade — disse à AFP uma fonte próxima ao presidente sobre os encontros desta segunda, acrescentando que poderia haver outros nomes.
No entanto, a extrema-direita tampouco parece aceitar ambos os cotados. Em entrevista nesta segunda ao TF1, o deputado Jean-Philippe Tanguy, do RN, indicou que tanto o socialista quanto o republicano representariam uma continuidade do governo Macron.
— Cazeneuve e Macron é a mesma coisa. E Bertrand também é o Macron — disse, acrescentando: — Cazeneuve não é de esquerda e Bertrand não é de direita, eles são mais ou menos macronistas destituídos.
Ao longo do dia, outro personagem, desconhecido do grande público, apareceu correndo por fora: Thierry Beaudet, presidente desde 2021 do Conselho Econômico, Social e Ambiental (CESE), a terceira câmara constitucional da República francesa, ao lado da Assembleia Nacional e do Senado. No entanto, lideranças de diferentes espectros ideológicos manifestaram ceticismo em relação a Beaudet, que nunca concorreu a um cargo eletivo.
— [Beaudet] não tem legitimidade própria. Ninguém o conhece — disse a deputada ecologista Sophie Taillé-Polian, da frente de esquerda. — Ele teria toda a sua nomeação nas mãos de Emmanuel Macron e isso o tornaria (...) um fantoche.
Embora o tempo tenha corrido até agora a favor de Macron, que adiou a decisão de nomear um premier para depois dos Jogos Olímpicos de Paris, a indefinição sobre o Orçamento de 2025 mudou o jogo. O presidente — que não pode dissolver a Assembleia novamente até julho do ano que vem — tem até 1º de outubro para indicar um nome, prazo para que as contas do ano que vem sejam apresentadas no Parlamento.
O impasse acontece no momento em que a França corre o risco de enfrentar uma nova crise econômica devido ao déficit orçamentário de 154 bilhões de euros, cerca de 5,5% do PIB de 2023. Hoje, a dívida pública do país é 110% do seu Produto Interno Bruto.
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