Quando sobe ao palco para falar sobre a própria trajetória ou sobre o mercado financeiro, Tarciana Medeiros, a primeira mulher a presidir o Banco do Brasil, não precisa mais começar pela sua história de vida, que já se tornou conhecida no país e no exterior. Mulher negra, paraibana, filha de feirante e com 24 anos de carreira no banco, ela pode, agora, começar pelo episódio mais desafiador e recente: o último um ano e meio em que está na presidência do BB.
Nesse curto espaço de tempo, ser a única mulher CEO nas reuniões da Federação Brasileira dos Bancos (Febraban), que reúne 119 instituições no país, foi apenas a primeira novidade: Tarciana montou o Conselho Diretor mais diverso do sistema financeiro, com 45% das cadeiras de vice-presidência do Banco do Brasil ocupada por mulheres: Carla Nesi, na área de Negócios de Varejo, Marisa Reghini Mattos, na área de Negócios Digitais, e Ana Cristina Rosa Garcia, vice-presidente Corporativa. “O que mais me impactou quando cheguei à presidência do Banco do Brasil foi constatar que não havia outras mulheres em cargos de liderança”, disse Tarciana em entrevista à Marie Claire.
Para ela, ter mais mulheres de diversas origens e regiões no conselho faz toda diferença na hora tomar decisões importantes: “Na gestão interna, passamos a considerar ainda mais as necessidades das mulheres e das famílias. O mesmo aconteceu nas decisões de mercado: nas análises de crédito, por exemplo, os modelos desenvolvidos até então traziam um viés mais masculino. Então foi preciso trazer novos olhares para entender as questões financeiras das mulheres”.
O desafio pela frente é ainda maior: ter 30% de pessoas de etnias e raças sub-representadas e 30% de mulheres em posições de liderança na instituição até 2025. É o compromisso firmado pelo Banco do Brasil, desde que se tornou embaixador dos movimentos do Pacto Global da ONU: Elas Lideram, Raça é Prioridade e Salário Digno. Eles ganham escala inclusive diante do potencial do Banco influenciar positivamente em toda sua cadeia de fornecedores e clientes empregadores pelo país.
“Além das próprias metas do Banco, nós assumimos o dever de ser o exemplo e incluir outras empresas, não apenas as grandes: temos o dever de capacitar e incluir mulheres microempreendedoras, apoiar e buscar parcerias”.
No país, onde mais de 10 milhões de mulheres são donas de negócios, os programas do BB voltados para as empreendedoras foram pensados a partir de quatro pilares: “Temos que ter segurança, saúde, capacitação e crédito. Sem isso, a mulher não tem liberdade de escolha”, diz Tarciana.
A plataforma Mulheres no Topo
Empoderar é o verbo da autonomia e, nesse caso, empoderar mulheres vai muito além de oferecer linhas de crédito. A constatação de que proporcionar conhecimento sobre negócios e investimentos seria uma excelente forma de apoiar ainda mais empreendedoras foi o ponto de partida para a criação da plataforma Mulheres no Topo.
O conhecimento traz o uso consciente do crédito e incentiva essas empreendedoras a investir no próprio negócio: o Banco do Brasil gerou 43 bilhões de créditos para empresas dirigidas por mulheres, entre 2023 e o primeiro trimestre de 2024, “com linhas e taxas de juros diferenciadas para elas”, diz Tarciana.
“Muitas delas nunca tiveram acesso às operações de investimento. Elas conhecem tudo sobre o próprio negócio, mas a plataforma vem para entregar esse conhecimento e o crédito vem para complementar uma cadeia de orientação e incentivo para empreender”.
A educação teve um papel fundamental na história de Tarciana, assim como o valor do trabalho. Dos 8 aos 15 anos de idade, ela ajudou o pai na barraca da feira, ao mesmo tempo em que recebeu muito incentivo para estudar. Das tias, empregadas domésticas, vinha o dinheiro para a compra dos livros e, também, o exemplo da cooperação, da busca pela solução para qualquer desafio.
“De onde eu venho, a gente tinha tão pouco e era tudo tão difícil, que eu tenho dificuldade de enxergar problemas. Pra mim, um problema tem que ser muito grande para ser considerado um problema. Tudo é possível de resolver, basta que se queira fazer”.
Possivelmente, essa determinação foi fundamental há 24 anos, quando a então escriturária afirmou, logo que tomou posse no Banco do Brasil: “quero ser diretora”. Hoje, a primeira presidenta da instituição sabe que não basta chegar lá sendo a única. O desejo, então, é coletivo:
"Precisamos ser a última geração de primeiras. Quero que, cada vez mais, as mulheres alcancem o topo das vidas delas."