Direitos Humanos
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Por Arthur Leal

Recrutada pela autodeclarada guru espiritual e bruxa Katiuscia Torres, de 34 anos – que está presa preventivamente em Minas Gerais desde novembro por suspeita de submeter pessoas a condições análogas à escravidão –, e envolvida numa série de polêmicas supostamente arquitetadas por ela, a jovem Letícia Maia Alvarenga, de 21 anos, retornou à família, após 8 meses sendo considerada desaparecida pelos pais. A garota foi deportada dos Estados Unidos depois de ter sido flagrada com documentação irregular quando foi presa no estado americano de Maine. Chegou ao Brasil esta semana. Ela, Torres e outra brasileira, a paulista Desirrê Freitas, de 26 anos, foram detidas quando tentavam atravessar a fronteira em direção ao Canadá. Kat Torres, ou Kat Luz, como ficou conhecida entre os seguidores, estaria tentando escapar, após suspeitas de tráfico de pessoas, promoção à prostituição e extorsão terem caído sobre os seus ombros.

A reportagem entrou em contato com a mãe de Letícia, Elenize Maia Alvarenga, de 50 anos, que confirmou que a filha já voltou para casa. Eles vivem em Perdões (MG). A jovem foi levada a uma viagem de fim de ano pelos pais e irmãos, que tentam se reconectar com ela. Como o processo corre em sigilo, Elenize optou por não dar entrevista no momento. O advogado da família, Luiz Henrique Santana, afirma que a jovem é uma das vítimas de Kat Torres, fato que ainda é apurado.

– O processo corre em segredo de justiça e infelizmente não posso passar maiores detalhes. Mas posso adiantar que ela foi vítima, igual a varias outras mulheres – disse Luiz Henrique. – Posso dizer, também, que ela já está bem mais centrada.

Antes e depois: Letícia, ainda adolescente, ao lado das irmãs e do pai; abaixo, ela já vivendo com Kat Torres — Foto: Reprodução
Antes e depois: Letícia, ainda adolescente, ao lado das irmãs e do pai; abaixo, ela já vivendo com Kat Torres — Foto: Reprodução

Desde que parentes e amigos se mobilizaram para encontrar Letícia e expor as condições suspeitas às quais ela vinha sendo mantida há meses nos Estados Unidos, a jovem apareceu por diversas vezes em vídeos polêmicos nas redes sociais em que, eles acreditam, era manipulada por Kat Torres. A guru referia-se a ela como uma espécie de funcionária ou secretária da seita. Surgia ali a dúvida: ela e Desirrê seriam vítimas ou cúmplices de Katiuscia?

Na ocasião, Letícia, a falsa guru e Desirrê fizeram ataques até à top model brasileira Yasmin Brunet, que ao saber sobre o caso, tentou intervir e ajudar as garotas. As insinuações foram graves: chegaram a afirmar que Brunet promovia tráfico de pessoas e encenaram numa rede social que ela as mantinha em cativeiro – justamente crimes pelos quais Katiuscia Torres hoje responde e é investigada pela Polícia Federal. A modelo foi à delegacia em São Paulo, que abriu inquérito. As três já respondem na Justiça paulista por calúnia, difamação e ameaças. Torres admitiu que mentiu para se vingar.

Letícia (à esq.) e Kat: garota não sorri em fotos publicadas por ex-modelo — Foto: Reprodução
Letícia (à esq.) e Kat: garota não sorri em fotos publicadas por ex-modelo — Foto: Reprodução

Letícia agiu de forma parecida, também, em vídeo direcionado à família que, preocupada, se mobilizava para encontrá-la e repatriá-la. Em declaração forte e que mais chamou atenção de seguidores que acompanhavam o caso, a jovem afirmou categoricamente que saiu de casa porque sofria abusos sexuais por parte do pai desde a infância. Ele, o bancário Cleider Alvarenga Lopes, de 55 anos, negou imediatamente, assim como a esposa e as outras filhas, e mais uma vez afirmaram que ela estaria sendo forçada a dar essas declarações. Após a volta ao Brasil, há indícios de que ela já tenha voltado atrás da acusação.

– Este caso também corre em sigilo, mas o delegado já adiantou que pedirá o arquivamento – limitou-se a dizer o advogado.

"Minha filha, é uma acusação muito grave o que você fala, eu abusei de afeto e carinho mais eu sei que você foi forçada pela Kat a falar tudo isso. Tudo mentira", disse o pai após a publicação do vídeo, no perfil de Kat Torres.

A reportagem apurou que Letícia Maia já prestou depoimento no âmbito do inquérito que investiga Kat Torres por submeter pessoas a condições análogas à escravidão. Uma fonte ouvida, que teve acesso ao processo sigiloso, confirma que as suspeitas são, sobretudo, de tráfico de pessoas para fim de exploração sexual – prostituição. O GLOBO ouviu supostas vítimas da guru, que já deram seu depoimento, também, ao MPF. São dezenas de casos.

Kat Torres assumidamente consumia chá de Ayahuasca, semelhante ao usado nos rituais de Santo Daime, e compartilhava com os seguidores de sua seita. A droga fermentada é altamente alucinógena e causa efeitos que podem durar até 10 horas. Os parentes acreditam que a bruxa utilizava dessa substância para manter as vítimas confusas e sob seu poder.

Há cerca de duas semanas, a outra jovem, Desirrê Freitas, presa na penitenciária para imigrantes dos EUA, na Georgia – a mesma onde estava Letícia –, firmou um acordo de deportação voluntária com a imigração americana. Ela ainda não retornou ao Brasil.

Sem visto e sem carteira de habilitação

Katiuscia Torres já havia feito no passado um acordo semelhante com o governo americano. Após ter se divorciado do ex-marido e sem o green card, ela não tinha mais situação legal no país e teve a saída decretada pela imigração americana. Ela, no entanto, permaneceu em solo americano. Ao ser detida em Maine e com documentação irregular, dessa vez teve a deportação imediatamente decretada.

Nos EUA, Kat Torres não tinha autorização sequer para dirigir. Supostas vítimas afirmam que o marido dela, Zachary Joshua Menkin, de 23 anos, seria o responsável por levar as mulheres recrutadas pela guru até os programas de prostituição. O casal aparece em várias fotos, exibindo o porte físico e o luxo de fachada. Nos registros, ele está quase sempre acariciando um cão branco de raça, como em um vídeo onde ele observa com tranquilidade enquanto Letícia Maia, aparentemente drogada, corre em torno de um gramado, entra num chafariz de roupa e depois cai no chão. As imagens foram determinantes para que sua família resolvesse tomar providências para repatriá-la.

Kat Torres e o namorado, Zack: segundo denunciantes, homem pode ter participação nos crimes — Foto: Reprodução
Kat Torres e o namorado, Zack: segundo denunciantes, homem pode ter participação nos crimes — Foto: Reprodução

'Eram amigas', diz defesa de guru

O caso é investigado pela Polícia Federal e pelo Ministério Público Federal. O processo tramita na Justiça Federal de São Paulo. O advogado de Katiuscia Torres, Rodrigo Alves da Silva Menezes, afirmou, em nota enviada ao fim de novembro, que sua cliente é inocente e que ela, Letícia e Desirrê são apenas amigas. Procurado nesta terça-feira, preferiu não se manifestar devido ao sigilo do processo. Torres está presa na Penitenciária de Belo Horizonte I - Complexo Penitenciário Feminino Estevão Pinto.

– Kat Torres somente foi deportada dos EUA em face do vencimento de seu visto, nada mais. As acusações contra ela são infundadas e minha cliente jamais praticou os crimes pelos quais está sendo acusada. A informação de que ela pudesse submeter pessoa à condição análoga à escravidão, bem como exploração sexual de brasileiras nos EUA não procede e isto será comprovado ao longo da instrução processual – disse Rodrigo. – Kat Torres, Letícia Maia e Desirré Freitas são amigas e a relação entre elas não envolve qualquer tipo de crime.

Kat, Desirrê e Letícia, em última foto publicada antes de terem sido presas nos EUA — Foto: Reprodução
Kat, Desirrê e Letícia, em última foto publicada antes de terem sido presas nos EUA — Foto: Reprodução

Ele acrescentou ainda que sua cliente está "muito abalada" desde que foi presa. Ela retornou ao Brasil com dezenas de imigrantes ilegais após ter sido deportada dos EUA. Foi presa assim que o avião pousou em MG.

– Kat Torres é declaradamente bruxa, ou seja, é a fé que ela professa, e isto tem que ser respeitado. Por fim, apesar de estar muito abalada com a prisão em si, ela está confiante de que, por não haver praticado nenhum daqueles crimes apontados pelo MPF, terá a oportunidade de esclarecer os fatos de maneira escorreita, e, a verdade será trazida no bojo do processo judicial

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