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Por Yasmin Nigri — Rio de Janeiro

A obra extensa e inclassificável de Walter Benjamin, nascido em 15 de julho de 1982, em Berlim, é investigada em pormenor no livro de ensaios “Walter Benjamin metacrítico”, da poeta, pesquisadora e professora Patrícia Lavelle. O projeto crítico do alemão, após 130 anos de seu nascimento, segue vigoroso, tanto por promover o encontro de saberes inconscientes por meio de sua prosa poética, quanto por mobilizar recursos rítmicos dando sensação de movimento à sua escrita inquietante.

Vale até um paralelo com Stan Brakhage (1933-2003), cineasta experimental americano, que fez cinema para o olhar não doutrinado, com filmes sem narrativa, trilha sonora nem personagens. Assim como Brakhage, Benjamin não se interessava pelas formas tradicionais dos tratados e sistemas universalistas que compõem grande parte da história da filosofia.

A grande diferença entre Benjamin e Brakhage está na maneira como ambos escolhem expor suas imagens de pensamento. Convertendo “experiências inexperienciáveis” com auxílio da materialidade formal de seus suportes, Brakhage projetou imagens contidas em fotografias multicoloridas e não figurativas que ele pintou à mão logo no início de sua carreira, e que só o olhar inocente da infância é capaz de entender. Já Benjamin se valeu de suas experiências de infância para trazer à tona figuras de linguagem cuja materialidade textual instiga novas formas de ver.

O resultado é um grande desafio ao olhar subordinado do sujeito que se aventura nessa jornada transformadora da percepção de mundo. Tanto no ganho de sentido da experiência enquanto mosaico ou constelação infinita de perspectivas não excludentes, como também sobre a importância do caráter interdisciplinar do pensamento, pois os saberes são complementares à formação do olhar e, portanto, ao exercício filosófico do pensamento.

Com poesia

Pensar junto era outra característica de Benjamin, cujo repertório e erudição o auxiliaram a erguer uma filosofia da história contrária à de seus predecessores Kant e Hegel, com quem Benjamin dialogou no decorrer de sua carreira acadêmica. Foi somente em sua tese de doutoramento sobre “O conceito de crítica de arte do Romantismo Alemão” que ele rompeu em definitivo com os paradigmas conceituais sobre linguagem, verdade e história dos dois filósofos mais influentes de seu tempo.

Lavelle honra seu objeto ao conciliar a experiência da metáfora como fio condutor da narrativa de seus sete ensaios sobre o desenvolvimento do conceito de crítica no percurso do filósofo, que deixou um volume massivo de textos ensaísticos, cartas, fragmentos, entre outros gêneros antes impensáveis como suporte para o exercício filosófico.

A oposição entre filosofia e poesia é posta à prova por Lavelle, tornando positivo o caráter metacrítico, ou seja, a crítica da crítica aos modos tradicionais de reflexão filosófica que “de certo modo antecipa reflexões contemporâneas que, tomando a metáfora como ponto de partida, repensam fronteiras e propõem passagens entre os campos do poético e do teórico”.

Para mirar o futuro

'Walter Benjamin metacrítico', livro de Patricia Lavelle — Foto: Reprodução
'Walter Benjamin metacrítico', livro de Patricia Lavelle — Foto: Reprodução

Benjamin nos ensina que por trás do gesto crítico é que os clássicos — que aparecem como as verdadeiras obras de arte em contraposição aos monumentos de cultura — sobrevivem com perspectiva renovada, privilégio de quem sabe olhar e traduzir suas experiências em uma narrativa ao mesmo tempo poética e profetizante, tanto dos conteúdos internos à obra quando da historia de sua recepção. Lavelle agora ocupa um papel de destaque no cenário brasileiro das discussões sobre Benjamin no meio acadêmico, junto a nomes como Jeanne Marie Gagnebin, Luciano Gatti, Ernani Chaves e Carla Damião, entre outros.

Apesar de exigente, o vigor filosófico de Benjamin é inegável e nos auxilia a interpretar o presente de maneira oxigenada, porque nos orienta a mirar horizontes futuros presentes em germe na atualidade, e também para que seja possível cultivar a esperança revidando ativamente o projeto político da melancolia, que nos atomiza diante da impotência frente a um mundo cheio de injustiças.

“Walter Benjamin metacrítico”. Autora: Patrícia Lavelle. Editora: Relicário. Páginas: 197. Preço: R$ 59,90. Cotação: Ótimo.

Yasmin Nigri é poeta e filósofa

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