Cultura
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Por e — São Paulo e Rio

Neste sábado (8), o perfil Acervo Maria da Conceição Tavares, na rede social X, amanheceu com uma nota triste. “Hoje, com 94 anos, ela se despediu de nós dessa terra. Descanse em paz, nossa grande economista, a maior luso-brasileira que vi na vida! Expresso meus pêsames à familia por meio deste acervo”, diz a publicação. O sucesso do Acervo Maria da Conceição Tavares, que acumula quase 60 mil seguidores, atesta que a prestigiada economista, morta neste sábado, havia ultrapassado os limites da política e da academia e se tornado uma figura pop nas redes sociais, graças a seu jeito enérgico de falar e sua indignação diante da desigualdade.

O Acervo também compartilhou uma publicação do ano passado que destaca a trajetória de Conceição, que aportou no Brasil em 1954, fugindo da ditadura fascista de Salazar, trabalhou na Cepal (Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe), no Chile, foi deputada federal pelo Partido dos Trabalhadores (PT) do Rio de Janeiro e professora da UFRJ e da Unicamp.

Conceição é popular nas redes sociais desde 2020, quando viralizou no então Twitter um trecho de uma entrevista dada ao programa “Roda viva”, da TV Cultura, nos anos 1990, ainda em seus tempos de deputada. Com sua voz rouca de fumante, sotaque português e a braveza característica, ela afirmou que um economista que não se preocupa com a justiça social não é “sério”, mas um “tecnocrata”.

“Uma economia que diz que precisa primeiro estabilizar, depois crescer, depois distribuir, é uma falácia. E tem sido uma falácia. Nem estabiliza, cresce aos solavancos e não distribui. E esta é a história da economia brasileira desde o pós-guerra”, afirmou a contundente economista de esquerda à bancada que a entrevistava. Conceição disse ainda que uma das “maiores dores” de sua vida era ver antigos companheiros de luta, que compartilhavam de sua análise, mudarem de lado. “É dor, mas também é raiva. E, portanto, energia para lutar”, explicou. “Se você não se preocupa com a justiça social, com quem paga conta, você não é um economista sério. Você é um tecnocrata”, arrematou.

Trechos de entrevistas, palestras e aulas da economista podem ser conferidas no Acervo Maria da Conceição Tavares. Num dos vídeos, ela explicou que o mercado é uma “ilusão”, ainda que algumas pessoas não entendam isso “até que lhe bata o mercado nos cornos”. “Aí ele aprende que o mercado é uma porcaria, mas já lhe bateu nos cornos, vai ter que construir tudo de novo”, completou. Sobre a “doutrina liberal”, que afirma que “o mercado e a democracia vão juntos, são inseparáveis”, ela declarou: “Isto é uma praga!”.

Em suas aulas, a economista combinava críticas ao capitalismo e amplo conhecimento da história econômica com humor (às vezes involuntário, resultado de seu sotaque luso e de sua retórica revoltada). “Só faz de conta que a política não interessa quem manda, meu bem”, disse ela em uma aula, com um cigarro entre os dedos. “Isto é um curso rebelde. Nós perdemos. Nós somos os derrotados.”

“Estamos lutando pela hegemonia? Imagine-se. Estamos lutando apenas para não ficar malucos. Para não dizer besteira demais. Para não contribuir com a nossa gota de fel para um veneno alheio. Tomemos a nossa cicuta com tranquilidade, meus filhos. E até a próxima quarta”, finalizou.

Sucesso pré-internet

Vários trechos que viralizaram nas redes sociais (não só no Twitter, mas também no TikTok) são provenientes de um curso sobre economia política ministrado em 1992 e disponível no canal do Instituto de Economia (IE) da Unicamp no YouTube. Só a aula inaugural tem 436 mil visualizações. Os vídeos da professora fazem tanto sucesso que o canal foi atacado por hackers em outubro de 2021.

Para além dos vídeos, a economista alçada ao posto de diva também rendeu memes diversos. Um deles, que viralizou em 2021 e ironizava slogans políticos, estampa uma foto da professora (cigarro entre os dedos) e diz: “Ela não tem paciência com a Inglaterra, ela não tem pulmão, ela não tem fôlego, mas ela tem os gays!”. Seus fãs de ganharam o apelido de “tavarers”.

Conceição, no entanto, já viralizava antes mesmo da internet. Nos anos 1990, ela inspirou a humorista Nádia Maria (1931-2000) a criar a personagem Maria da Recessão Colares, inicialmente como uma aluna da “Escolinha do Professor Raimundo” e, mais tarde, no programa “Chico Total”, ambos criados por Chico Anysio (1931-2012).

Como Maria da Recessão Colares, Nádia Maria arrancava risos dos colegas e do próprio Chico Anysio ao reproduzir os trejeitos, a voz rascante e as variações de tonalidade de Maria da Conceição. Curiosamente, a comediante especializou-se em interpretar economistas: ela também criou para a “Escolinha” as personagens Doroféia Ienéck, inspirada em Dorothea Werneck, e Célia Caridosa de Mello, versão cômica da ex-ministra Zélia Cardoso de Mello (que viria a se casar com Chico Anysio após fazer uma participação no programa).

Conceição talvez tenha protagonizado seu primeiro meme em 1986, numa entrevista à TV Globo. À época, ela era assessora do governo Sarney e foi à televisão explicar para a população o Plano Cruzado, tentativa (que não deu certo) de combater a inflação. Ela não escondeu a emoção e chorou. “Eu estou muito contente de ver uma equipe econômica que redime este país, que dá uma contribuição política, que ajuda o governo a encontrar seu rumo”, disse ela, que também aproveitou, é claro, para esbravejar contra os tecnocratas e puxar a orelha de metade de seus alunos que “se corrompeu” ou “desistiu, cansou”.

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