Depois de uma longa espera, finalmente, o show vai continuar. É hora de montar o palco, enfeitar as mesas, ligar o som e servir os convidados. Com o fim das restrições sanitárias impostas pela pandemia, o setor de eventos vive, em 2022, dois anos em um.
O segundo semestre promete ser frenético nos negócios que viabilizam desde festas de casamento e aniversários aos grandes congressos e feiras corporativas, mas faltam espaço, mão de obra e fornecedores.
Agendas lotadas, com filas até 2023, marcam a retomada do setor, e o desequilíbrio entre essa alta demanda e a oferta de serviços infla os preços. Os eventos estão até 30% mais caros do que em 2019, antes de a pandemia derrubar o setor no início de 2020.
Após tanta espera, famílias e empresas estão buscando compensar dois anos de abstinência com festividades e eventos grandiosos, levando Doreni Caramori Júnior, presidente da Associação Brasileira dos Promotores de Eventos (Abrape), a dizer que o setor vive agora seu melhor momento.
Eventos corporativos e sociais voltam a acontecer com força total
Mas, como foi um dos segmentos mais prejudicados na pandemia, 44% das empresas fecharam ou voltaram com capacidade parcial, e 45% tiveram que tomar empréstimos para sobreviver, mostra uma pesquisa da entidade com o Sebrae.
O setor tem mais de 647 mil empresas e 2,4 milhões de microempreendedores. Há menos fornecedores e pouco tempo para treinar nova mão de obra. Isso abre oportunidades num setor que envolve mais de 50 cadeias produtivas, mobiliza em torno de 6 milhões de pessoas e movimenta R$ 334 bilhões por ano (cerca de 4,5% do PIB).
— Desde outubro a demanda aumentou muito. O desafio é a outra ponta, a oferta, porque tem uma cadeia desestruturada. Muitas pessoas foram para outros setores, empresas quebraram, venderam equipamentos. Tudo isso está fazendo os custos aumentarem e a margem diminuir — diz Caramori.
Fim de ano em janeiro
Os telefones de empresas que realizam casamentos, aniversários, congressos e feiras não param de tocar. Muitos ainda estão cumprindo a agenda de eventos adiados pela pandemia, e novas vagas, em muitos casos, só há no ano que vem.
Nos últimos dois anos, o governo promoveu mudanças nas regras do setor, ampliando os prazos de remarcação para eventos culturais e de turismo impactados pela Covid-19. Na última quarta-feira, o Congresso aprovou mais uma Medida Provisória que prorroga em um ano a data limite para cumprimento dos contratos.
Milena Palumbo, CEO da GL events Brasil, explica que a retomada na área de entretenimento, como shows, é mais rápida e ganha força desde outubro. Já eventos técnicos e científicos e feiras de negócios precisam de cerca de um ano de planejamento e só começaram a voltar em março.
— A cadeia se sobrecarregou porque muitos fornecedores sumiram, pois, além de ficarem fechados, são altamente impactados pela alta do diesel e da construção. Uma feira é como um shopping pop-up (temporário). Ou seja, a estrutura envolve madeira, cabo elétrico, compensado, metalon (aço). E tudo isso subiu.
Fabrício Granito, CEO do Grupo Hel, que organiza principalmente eventos corporativos, diz estar marcando para janeiro festas de fim de ano para empresas, tanta é a procura:
— Tem a demanda que estava reprimida há dois anos e a de agora, na área corporativa e social. Não tem mais vaga em espaços no segundo semestre — diz Granito, observando que, apesar do alto desemprego no país, a mão de obra especializada é escassa.
— Faltam cenógrafos, marceneiros, produtores. E os que sobraram estão cobrando o dobro. Juntando a inflação com bufê, decoração, transporte e logística, está, em geral, 30% mais caro fazer evento hoje do que em 2019.
Hora de investir
Caramorini acredita que, depois da euforia deste ano, o mercado vai se equilibrar: — Em razão dos investimentos feitos neste momento, haverá um crescimento orgânico nas empresas.
Paloma Sias, que tem uma confeitaria com seu nome em Niterói (RJ) e fazia bolos de casamento, inovou com kits com doces e bem-casados na pandemia e parcerias. Isso a ajudou a aumentar a estrutura.
— No isolamento, o combo para festas em casa me deu visibilidade e, com o dinheiro, montei um escritório, equipei a cozinha e me preparei para a demanda que viria agora. Estou com a agenda praticamente fechada neste ano. Por causa das remarcações dos salões e bufês, há festas até no meio da semana — diz Paloma, que já contratou dois ajudantes.
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Cristiani Giardini também tem aproveitado a disposição dos clientes para festas em dias de semana em São Paulo. Além dos eventos corporativos, ela investe principalmente no preparo especial de casamentos judaicos, que são realizados às quintas e aos domingos.
Assim, os dois salões do Grupo Giardini estão em uso mais dias na semana do que o usual e devem se manter assim durante todo o segundo semestre. Rodrigo Lasmar, sócio da ExC Rio, espaço para festas dentro Jockey Club, no Rio, tem o mesmo diagnóstico:
— O social voltou com intensidade. Com isso, as pessoas estão diversificando as datas e aceitando casar durante a semana, na sexta e no domingo, o que não era comum.
Para Carol Sampaio, sócia da CS Eventos, o mercado aquecido aumenta a confiança das marcas em viabilizar patrocínios, o que gera mais oportunidades no setor:
— Produção, com congressos e eventos para empresas, vêm com força. No cerimonial, temos ao menos dois fins de semana por mês cheios até dezembro — diz a promoter e empresária, contando que muita gente que adiou festas quer celebrar agora em grande estilo.
Um exemplo desse espírito foi a festa de três dias na Bahia — com direito a show de Ivete Sangalo — que a decoradora e cerimonialista da Sal Grosso Evento, Ticiana Szapiro, organizou para um cliente.
Ele pediu uma celebração épica para comemorar de uma só vez seus aniversários de 39, 40 e 41 anos, inviabilizados pela pandemia. Entre remarcações e novos eventos, Ticiana diz ter poucos fins de semana livres na empresa, mas sofre com a falta de gente nos bastidores:
— Perdemos fornecedores e gente qualificada, e não temos tempo de treinar. Mesmo sem mão de obra, os parceiros estão pegando muitos trabalhos para pagar o que ficaram devendo na pandemia, o que deixa algumas lacunas.
A chef Malu Mello conta que a demanda em sua empresa de catering dobrou nos últimos quatro meses para eventos corporativos, mas ela destaca também os reencontros.
— Um modelo que surgiu é o encontro de colegas na casa de alguém. Não é aniversário nem reunião, mas um encontro mais casual — diz a empresária, que está com encomendas fechadas até o fim de julho.
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O decorador João Curvelo aponta outra tendência no pós-pandemia: o destination wedding, nome em inglês para casamentos realizados fora da cidade dos noivos e convidados. Neste formato que combina celebração e turismo, familiares e amigos participam da cerimônia e de outras festas em cerca de três dias.
Novos modelos de festas
Rústico, charmoso e belíssimo, São Miguel dos Milagres, no litoral de Alagoas, virou um dos destinos preferidos. Curvelo diz que esse deslocamento das festas para a região evidenciou, nos preços, a falta de fornecedores como floristas:
— A produção caiu muito e os preços aumentaram. Um maço de rosa que eu conseguia entre R$ 15 e 20, hoje chega a custar R$ 120.