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Por Antonio Carlos Secchin

Em Nélida Piñon conviveram dimensões em geral antagônicas ou incompatíveis, mas que na sua obra perfeitamente se harmonizavam. A estreia, em 1961, com “Guia Mapa de Gabriel Arcanjo” (livro jamais reeditado), apontava para uma direção em que a realidade só se manifestava por meios de símbolos, de abstrações, bastante afastados de alguma perceptível referencialidade.

Sem abdicar do caráter intrinsicamente enigmático da literatura, pois à arte não cabe formular respostas ou apontar verdades, Nélida deixou-se impregnar pela História e pelas histórias de sua ancestralidade, a exemplo do que se verifica numa de suas maiores realizações, “A república dos sonhos” (1984).

A dimensão épica e coletiva de seus grandes relatos nunca negligenciou o cuidado e o afeto para com os rumores da esquina, as tramas da existência cotidiana, a luta pela sobrevivência daqueles a quem a sorte foi sonegada. Daí que, ao lado de uma vertente ostensivamente mítica, sua narrativa esteja carregada de encanto por aquilo que Ferreira Gullar denominou “a estranha vida banal”.

Nélida se espraiou nas veredas da crônica, do ensaio, da literatura infantil, do conto, embora fosse o romance — e sempre de largo fôlego — a modalidade em que mais investisse o inequívoco talento.

Não nos esqueçamos também da cidadã Nélida, engajada no bom combate. Seja em corajosos manifestos contra a censura, em pleno período ditatorial no país, seja nas numerosas entrevistas que concedeu ou nas conferências proferidas ao longo de décadas, a defesa da liberdade nela ressoa como traço veemente e constante.

Incentivadora de novos talentos, afável no trato, aferrada a inquebrantáveis princípios éticos, Nélida foi um modelo para os que tiveram a ventura de conhecê-la, e que puderam beneficiar-se da erudição e da sabedoria com que se expressava, num discurso ao mesmo tempo simples e incisivo.

Como ela gostava de afirmar, o escritor é multiforme: contém, potencialmente, todas as etnias, todas as sexualidades, todas as temporalidades. Esta foi a múltipla Nélida, cujo legado nos cabe acolher e honrar.

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