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Por Ruan de Sousa Gabriel — São Paulo

Nunca foi tão fácil conhecer a Grécia (Antiga, é bom esclarecer). Quer saber as melhores histórias do Olimpo (a tórrida paixão de Ares e Afrodite, as escapadelas conjugais de Zeus e as vinganças de sua esposa Hera)? Pois é só ouvir o podcast “Noites gregas”. Deseja aprender grego antigo? Há cursos gratuitos no YouTube. Tem interesse nas tragédias? É só seguir os perfis certos no Instagram. Ou visitar uma livraria, onde novas traduções dos clássicos gregos se multiplicam nas estantes.

Até o seriado “White Lotus”, da HBO, se rendeu à Grécia. Sim, a trama da última temporada se passa na Sicília, mas em um episódio é narrada a história de Perséfone, filha da deusa Deméter que é estuprada por Hades, divindade do subterrâneo, casa-se com ele e se torna a rainha do mundo dos mortos. Também não passou despercebido do público que uma das protagonistas, Daphne, tem o mesmo nome da ninfa que rejeitou Apolo e foi transformada em árvore.

A Grécia Antiga também tem seu lado sombrio. Tanto que há quem queira até “cancelá-la”. Ela é alvo de controvérsia, estudos e discussão, “acusada” de ter lançado as bases do supremacismo branco e de exercer um sinistro fascínio sobre a extrema direita. Em 6 de janeiro de 2021, por exemplo, apoiadores de Donald Trump usavam, durante a invasão do Capitólio, símbolos greco-romanos, como bandeiras com a frase “Molon labe” (vem e toma), do general espartano Leônidas. Estudiosos como o dominicano Dan-el Padilla Peralta pedem pela renovação de estudos clássicos com ênfase naqueles que foram silenciados pela tradição, como mulheres, pobres e escravizados. Para se ter uma ideia, a Universidade Howard, nos EUA, que é historicamente afro-americana, extinguiu seu departamento de estudos clássicos em 2021.

Sim, os atenienses inventaram a democracia, mas também eram escravocratas e restringiam a participação política aos homens. Já a chamada civilização ocidental nasceu justamente na Grécia, e é por isso que ainda hoje nos reconhecemos na cultura clássica. Para o bem e para o mal.

Professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), o tradutor Leonardo Antunes concorda que a cultura clássica é “a origem de muitos males”, mas acrescenta:

— Por isso mesmo, me parece importante estudá-la. Assim como na terapia voltamos ao passado para compreender melhor quem somos e o que podemos fazer enquanto indivíduos, da mesma forma, como sociedade, é necessário olhar para a História e as produções culturais que vieram antes de nós para compreender melhor quem somos e o que podemos fazer enquanto coletividade — diz ele, que tem um canal no YouTube com seção dedicada a videogames inspirados na mitologia e extenso trabalho sobre tradução e musicalização de poemas da Grécia Antiga.

Responsável pela tradução da “Ilíada” e dos “Fragmentos completos” de Anacreonte, Antunes passou a compartilhar suas aulas de grego na rede no início da pandemia. O número de inscritos no canal quadruplicou.

Atualidade

Tradutor premiado da “Odisseia” e de várias tragédias gregas, Trajano Vieira também começou a produzir conteúdo sobre os clássicos no Instagram durante a pandemia. O doutor em Literatura Grega dá um recado para quem pensa em “cancelar” a cultura grega:

— Arrisco dizer que todos os clássicos gregos permanecem atuais, pois cada um deles coloca questões que de algum modo estão presentes entre nós. O mundo se empobreceria muito se deixássemos de ler autores como Homero e Safo, não só pela qualidade intrínseca de suas obras, como pelo fato de serem escritores retomados e repensados ao longo da tradição. Questão de arte e de memória, portanto. Grandes autores não devem ser subtraídos, mas somados a outros de diferentes tradições.

A equipe do podcast “Noites gregas” também pondera que “cancelar” a Grécia não é tão simples assim. Se por um lado a mitologia representa o triunfo da ordem patriarcal, representada por Zeus, por outro, ela produziu algumas das maiores personagens femininas da História, da deusa Atena à feiticeira Medeia.

— A Grécia é onde tudo começou. Até um peão de fazenda se vê em Odisseu — afirma o professor Cláudio Moreno, autor de livros como “Troia: o romance de uma guerra”, e que apresenta o “Noites gregas” ao lado do genro, o jornalista Filipe Speck (apelidado de Hermes, o mensageiro de Zeus).

Aos 76 anos, Moreno passou a vida a hipnotizar plateias com os mitos gregos. Décadas atrás, quando começou a dar aula, conseguiu controlar uma turma rebelde (conhecida por atacar professores a laranjadas) contando a “Odisseia”. Já o “Noites gregas” estreou em dezembro de 2019 e, nos últimos meses, vem contando a história da Guerra de Troia. Desde o início, Moreno já apresentou os principais deuses e heróis da Grécia, com especial atenção às personagens femininas da mitologia:

— O time das deusas é fortíssimo. Naquela zaga, nem o Flamengo passa.

Jaa Torrano, tradutor do “Teatro completo” de Eurípides, que a Editora 34 começou a lançar ano passado, conta que se interessou pela cultura clássica ainda na adolescência. Percebeu que precisava conhecer os gregos se quisesse estudar o filósofo alemão Martin Heidegger. O autor de “Ser e tempo” procurava respostas metafísicas em versos de Homero, Parmênides e Sófocles e aforismos de Heráclito. Em Eurípides, porém, há menos filosofia. Torrano explica que o fio condutor das tragédias é a noção mítica de justiça, o cumprimento dos desígnios dos deuses à revelia dos mortais.

Torrano ressalta, porém, que a cultura grega pode nos ensinar a compreender nossos próprios contemporâneos. Isso porque seus personagens nem sempre entendem a vontade divina, mas os leitores atuais possuem “condições e recursos para compreender o outro, seja esse outro o que for”.

— O conhecimento de uma cultura antiga causa estramento em nossos hábitos mentais — afirma o tradutor. — Os clássicos nos auxiliam na compreensão de outros horizontes cultuais e na superação de nossos próprios limites cognitivos.

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