Arqueologia

Por Vanessa Centamori

Utilizando deformação anatômica e um software para modelagem, uma equipe de pesquisadores criou uma aproximação facial inédita da espécie de hominídeo Homo floresiensis. O processo foi detalhado em estudo disponibilizado online nesta terça-feira (6) na revista OrtogOnLineMag.

O trabalho é uma colaboração entre o designer 3D brasileiro Cicero Moraes e os arqueólogos da Itália Luca Bezzi e Alessandro Bezzi. Todos eles fazem parte do grupo de pesquisa Arc-Team. A equipe baseou seu estudo na aproximação facial forense, técnica que aproxima a face de um indivíduo a partir do seu crânio, usada quando as informações para identificá-lo são escassas.

Conforme conta Moraes a GALILEU, em 2013 e 2015 sua equipe compôs duas mostras sobre evolução humana, uma no Brasil e outra na Itália. Em ambas eles apresentaram aproximações diferentes do H. floresiensis — uma baseada em escultura digital e outra na deformação anatômica de um chimpanzé. "Os anos se passaram e sentimo-nos instigados a aproximar novamente a face para ver como a técnica evoluiu", afirma o designer 3D.

Para realizar essa nova aproximação, os cientistas importaram na extensão OrtogOnBlender do software Blender 3D uma tomografia computadorizada de um crânio de H.floresiensis, feita pelo antropólogo Peter Brown, da Universidade Emory, nos EUA. O esqueleto contendo a caixa craniana foi descoberto em outubro de 2003 na caverna de Liang Bua, localizada na Ilha de Flores, na Indonésia, e recebeu o nome de “LB1” com as iniciais do local.

Etapas da aproximação facial por deformação anatômica — Foto: Cicero Moraes, Luca Bezzi e Alessandro Bezzi
Etapas da aproximação facial por deformação anatômica — Foto: Cicero Moraes, Luca Bezzi e Alessandro Bezzi

Estudos da época mostraram que o esqueleto da caverna, apresentado ao mundo em 2004 como “Hobbit das Flores” (alcunha inspirada na franquia de filmes Senhor dos Anéis), pertenceu provavelmente a uma mulher do gênero Homo. Ela havia morrido entre 16 mil e 18 mil anos antes e tinha apenas 1,06 metro de altura.

Agora, com o OrtogOnBlender, os autores obtiveram uma malha 3D com algumas regiões faltantes do crânio, que foram completadas. A pesquisa contou ainda com a tomografia de fósseis de “doadores virtuais” — primeiro a de um Homo sapiens, depois a de um chimpanzé-comum (Pan toglodytes), que passaram por deformação anatômica para chegarem à estrutura do H. floresiensis.

Esquerda: aproximação facial objetiva; direita: aproximação com elementos especulativos — Foto: Cicero Moraes, Luca Bezzi e Alessandro Bezzi
Esquerda: aproximação facial objetiva; direita: aproximação com elementos especulativos — Foto: Cicero Moraes, Luca Bezzi e Alessandro Bezzi

Uma vez que a deformação estava completa, a malha de outra aproximação facial foi aproveitada e ajustada sobre a face interpolada. Então, essa malha recebeu ajustes estruturais com auxílio de uma mesa digitalizadora.

Em seguida, a configuração anterior da pelagem foi ajustada para compatibilizar entre o Pan troglodytes e o Homo sapiens. Finalmente, a textura e o material da superfície também foram reajustados, e a iluminação digital composta para evidenciar detalhes estruturais da face.

O resultados foram duas abordagens de aproximação facial: uma mais objetiva, em escala de cinza, e outra mais artística, com cores na pele e nos pelos.

Compatibilidade com primatas

Para testarem a compatibilidade do Homo floresiensis com animais modernos, especialmente primatas, os pesquisadores compararam dados de volume do endocrânio usados no estudo com informações de tomografias e crânios de outros animais.

Para Moraes, essa parte foi a mais difícil. "O maior desafio foi interpolar os dados de animais diferentes, de modo a aproximar a face de um hominídeo que contém elementos de vários outros animais, grosso modo, como se fosse uma fusão dos mesmos", descreve o brasileiro.

Cluster de distribuição de animais diferentes. Volume na horizontal e circunferência da cabeça na vertical — Foto: Cicero Moraes, Luca Bezzi e Alessandro Bezzi
Cluster de distribuição de animais diferentes. Volume na horizontal e circunferência da cabeça na vertical — Foto: Cicero Moraes, Luca Bezzi e Alessandro Bezzi

Os cientistas posicionaram em um gráfico 2D a relação entre o volume do endocrânio e a circunferência da cabeça, e notaram que a posição do H.floresiensis dividia espaço com chimpanzés (Pan troglodytes) e orangotangos (Pongo abelii/pygmaeus).

Segundo os autores, "a proximidade entre espécies evidencia uma afinidade maior [do H.floresiensis] com os gorilas (Gorilla gorilla) do que com humanos modernos (Homo sapiens)". “Observa-se que o posicionamento do Homo floresiensis se distancia dos pontos mais extremos da amostra humana, entre outras espécies, em uma região de ‘transição’ estrutural”, concluem.

Zoom na região do cluster onde está presente o Homo floresiensis (ao centro) — Foto: Cicero Moraes, Luca Bezzi e Alessandro Bezzi
Zoom na região do cluster onde está presente o Homo floresiensis (ao centro) — Foto: Cicero Moraes, Luca Bezzi e Alessandro Bezzi

Confira um vídeo que mostra o processo de aproximação facial do Homo floresiensis:

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